terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Romeu e Julieta!

Romeu e Julieta!
Antonio Nunes de Souza*

A titularidade é a mesma, mas, não se trata da famosa épica obra teatral de William Shakespeare. Somente conhecidencia como nas estórias dessa vida louca que vivemos.
Nossos personagens são reais e protagonizaram momentos de agonia e desespero, reflexo da desarrumação inesperada causada pela invasão da favela do Alemão e a possível possibilidade de ocorrer o mesmo na da Rocinha.
A verdade é que Julieta, na flor dos seus 17 anos, filha da casta marginal mais importante da Rocinha, grande chefe e distribuidor atacadista de drogas, fornecedor de armas de altos calibres, organizador de planos para assaltos a bancos, seqüestros e, mais que respeitado, pela sua milícia composta de ex-militares de todas as forças. Consequentemente, um homem de grande nobreza criminal, que, um dia quando recebeu um tiro de raspão, em vez do lógico sangue, o que jorrou foi um líquido azul assustando todos, aquela prova cabal de realeza, através da cor que manchava suas roupas. Dessa data em diante sua respeitabilidade aumentou (se é que era possível) de uma maneira incomensurável. Porem, ninguém ficou sabendo que ele levava no bolso um frasco de azul de metileno que haviam recomendado para curar uma pequena infecção nas gengivas. E a bala, ao resvalar em seu corpo, quebrou o recipiente derramando o líquido anil. Mas, calado na hora ele ficou, para fortalecer a crendice da sua troupe de criminosos semi-analfabetos e subservientes.
Romeu por sua vez, não ficava atrás. Dezoito anos, único filho homem do poderoso rei da pasta de coca carioca, sediado na favela do Alemão, resultado de uma transa eventual quando tinha 14 anos e ainda era apenas um avião, porém, criou o moleque com tudo do bom e do melhor e, seu grande sonho era proporcionar um futuro decente para sua cria predileta, completamente fora da bandidagem que sempre viveu.
Dono de vários laboratórios, um dos maiores fornecedores de crack para Rio, Sampa e Minas, comanda vários pelotões de elite de assaltantes de caixas eletrônicos, especialista em arquitetar seqüestros relâmpagos, tendo como um dos mais respeitados predicados dirigir uma equipe de assassinos profissionais para, exclusivamente, crimes de mando, preferencialmente, na área política. Respeitadíssimo e temido em toda comunidade e no mundo do crime na América do Sul. Proclama-se envaidecido de ter nas mãos patentes policiais e políticos influentes!
Pelo visto, duas famílias de classes desclassificadas, dignas representantes do crime organizado! E, como normal nesses casos, inimigas cruéis em função da disputa das localizações de distribuições e desejo de monopólio no tráfico.
Entretanto, espertamente, ambos mantinham no chic bairro do Leblon, apartamentos bem montados (em diferentes edifícios), com toda estrutura, para seus filhos estudarem e freqüentarem ambientes sociais de primeira, obviamente, mantendo sigilo das suas origens. E a casualidade mais uma vez aconteceu! Os jovens se conheceram em um barzinho e começaram um namoro apaixonante, tanto quanto a shakespeariana estória. Mas, mesmo já acontecendo há alguns meses, ambos preservavam seus segredos, sabendo quanto seria perigoso se alguém tomasse conhecimento. E, ao mesmo tempo, era nutrido um profundo medo em ambos, já que se seus pais tomassem conhecimento, desencadearia uma verdadeira guerra e a proibição categórica dos seus românticos encontros, além da reação pela traição da desobediência.
Foi quando aconteceu o que eles mais temiam! Com a invasão da favela do Alemão, o pai de Romeu conseguiu fugir e, no desespero, foi esconder-se no ap do filho, que era um endereço totalmente desconhecido de todos. Com a chave que tinha em mãos, abriu a porta e se deparou com Romeu no maior rola-rola com sua amada Julieta. Até aí tudo bem, pois orgulhava da macheza do filho, mas, ao perguntar quem era ela, ela, descobrindo naquele momento quem era o pai de seu amor, resolveu aproveitar a situação e abrir o jogo da sua origem familiar, achando que na situação e circunstância, as coisas seriam recebidas de bom grado. Porém, o que aconteceu foi a consumação de uma desgraça. Revoltado pela atitude do filho, considerando uma fraqueza e traição, sacou a arma e atirou no próprio filho e, como vingança contra seu inimigo de tráfico, atirou várias vezes em Julieta, que despencou o corpo por cima do seu amor, repetindo, com similaridade, a triste tragédia da literatura inglesa!
Nomes iguais, amores incomensuráveis e destinos tristes.
No mundo do crime vigora o código da “lei do cão”. Traição e quebra das regras são pagas com a morte, independente de quem sejam. É a honra dos desonrados!
*Escritor (Vida Louca - ansouza_ba@hotmail.com)

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