Conversa entre amigas!
Antonio Nunes de Souza*
-Alô!
-Oi! É Vera querida!
-Diga aí, minha filha. Como vai você?
-Tudo bem. Continuo em Salvador batalhando um “trampo” na área, mas, está duro demais!
-Aqui também a barra está pesada. Trabalho na prefeitura e os salários estão sempre atrasados, além de ser uma merreca retada.
-Consegui um quebra galho de dois meses trabalhando na campanha política, mas, não lhe conto à merda que era.
-Me diga querida, pois deve ter sido bem divertido e agitado!
-Divertido não foi não, porém bastante agitado e passei as agruras do inferno.
-Me conte...
-Minha amiga, eu tinha de acordar todos os dias às cinco da manhã, me arrumar e tomar dois buzus para chegar ao comitê às sete horas, me apresentar e receber as instruções para que bairro deveria ir, socada dentro de uma Kombi velha desgraçada, com mais de quinze pessoas dentro, uma esfregação da zorra e o motorista picado pelas ruas, pois ganhava por viagens e queria fazer o mais que pudesse. Eu tremia de medo e no meu furico não passava nem pensamento preocupada com um acidente.
-Pô Amiga! Não foi mole. Verinha você deve ter sofrido bastante, não foi?
-Isso era só o começo mulher! Quando chegávamos ao destino, eles nos entregavam uma bandeira de dois metros e meio, presa em uma vara quase do mesmo tamanho e mandavam-me ficar na esquina sacudindo aquela merda de um lado para o outro, os carros passando raspando a gente e os filhos da puta ainda diziam piadas e sacanagens. Não tínhamos direito de sair do posto determinado para nada. Nem pra fazer xixi, pois não tinha nem lugar para isso. Às vezes quebrávamos o galho em algum barzinho camarada, quando o fiscal do partido dava uma sopa!
-Ainda bem que devia ser um turno só!
-Você tá brincando! A zorra ia até a noite que, quando chegava ao fim da tarde, eu nem mais sentia os ombros e os braços estavam dormentes. Uma fome retada, pois eles traziam um cachorro quente e um suco entre meio dia e uma hora que era o nosso almoço. O que nos alimentava e dava forças era a promessa que se o homem ganhasse todo mundo estaria empregado numa boa. Para quem está na pior, tem que se apegar a qualquer conversa e pedir a Deus que aconteça.
-Também, quando dava a noite, você se picava pra casa e ia descansar legal!
-Ah! Ah! Ah! Você tá brincando comigo minha filha! A noite que era que acontecia a tragédia pior. Pois, no fim do expediente, os descarados dos cabos eleitorais escolhiam as mais bonitinhas e nós tínhamos que sair com os caras para transar. E quem se recusava era despedida na hora sem a menor cerimônia. Era o verdadeiro “ou dá ou desce”! E eu com essa bundinha arrebitada era sempre escolhida quase toda noite, e, depois de passar o dia segurando no mastro da bandeira, tinha de sentar no mastro de um cabo eleitoral e ainda fazer cara que estava feliz. Imagine como eu chegava em casa, quase meia-noite, e tendo que levantar as cinco! Mas, pensando no emprego futuro, me submetia a essa situação toda sem chiar. Para me consolar intimamente eu pensava: tudo pelo social!
-Ka! Ka! Ka! Desculpe estar dando risada querida Vera, mas, embora sacrificante, não deixa de ser engraçada essa aventura.
-Engraçada para você que não passou por esse tormento!
-Espero que agora, depois dessa experiência desgraçada, você possa desfrutar do seu emprego numa boa e compense o sacrifício feito.
-Aí que vem a pior parte! O fdp perdeu a eleição, não pagaram os nossos salários do último mês e não vai ter emprego para ninguém. Nunca mais vou cair em conversa de fazer campanha, a não ser por idealismo e com liberdade de ação.
-E na área da sua formação, não tem aparecido nada?
-Minha filha o povo está tão louco que, paradoxalmente, nem reconhecem que as soluções podem ser contornadas através da psicologia. Eu devia era ter estudado medicina!
-Depois eu lhe conto sobre minha vida. Desligue para não acabar com seu crédito. Bateremos um papo no msn que é mais barato. Lembranças para essa turma legal aí de Castelo Branco.
-Um beijão querida!!!
-Tchau Verinha querida!
*Escritor (Vida Louca – ansouza_ba@hotmail.com)
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