quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

O retorno às orígens

O retorno às origens.
Antonio Nunes de Souza*

Os homens, segundo a história bíblica e também a universal, quando foram feitos pelo oleiro Mor ou surgiram de algum lugar do universo, encontraram a terra cheia de morros, montanhas, desertos, mares, rios, lagos, florestas, animais silvestres e ferozes, etc. Assim sendo, foram proliferando desordenadamente, vivendo em grupos, procurando melhores lugares para formar suas comunidades e fincar suas raízes, transformando tudo de agreste que existia em locais agradáveis, aprazíveis, salutares e, principalmente, que oferecessem as melhores comodidades possíveis, almejando alcançar a qualificação ideal, ou seja, a designação de civilidade.
Milhares de anos se passaram, criaram linguagens para suas comunicações, determinaram regras, leis e padrões, transformando aquele mundo selvagem em vilas, cidades e metrópoles.

Colocaram monumentos simbólicos demonstrando suas conquistas e vitórias, cada lugar querendo ser o que construía maior e mais bonito ícone representativo.
Inventaram os mais sofisticados aparelhos de comunicação, partindo dos sinais de tambores e fumaça, chegando ao rádio, telefone fixo, celular, televisão, internet, chips via satélites, radares e outras coisas mais, que já passaram hoje a ser de somenos importâncias ou obsoletos.
Para suas locomoções, que eram verdadeiras maratonas de andanças e arriscadas viagens através de cipós ou a pé, conseguiram substituir esses sufocos inventando a roda, depois a carroça, bicicleta, moto, carro, avião, helicóptero, nave espacial e uma série de outras máquinas para tais fins.
Para deleitar seu paladar e desejos gustativos, nada mais justo que, usando a imaginação, criar e produzir boas bebidas e iguarias ultra-sofisticadas, utilizando condimentos super exóticos e raros, que não lembram nem de longe aqueles javalis crus que eram devorados sem nenhuma educação pelos trogloditas seus antepassados.
Aí, depois dessa maravilhosa transformação, ao custo de milhões e milhões de anos, mortes, sacrifícios e muito trabalho, o homem, mais que justo, orgulhou-se por ter alcançado, praticamente, todos os seus objetivos e uma vida digna perante a humanidade.
Então, depois de estar desfrutando de todas essas maravilhas, começou a perceber quanto ele está cercado de problemas em função de tudo que foi criado ao longo dessa caminhada, causando-lhe uma novidade até bem pouco tempo desconhecida, logicamente, pela sua inexistência: O stress! Este é nada mais nada menos que a sensação de desconforto de ter que viver cercado de loucuras e tarefas do cotidiano. Causa uma impaciência ilimitada, irritação e, automaticamente, um processo depressivo igual a quem comprou o ingresso para ver uma apresentação de Milton Nascimento e, errando de teatro, se bate com um show de dupla sertaneja.
Resultado: O homem passou a rever os seus criados conceitos de vida maravilhosa, cidades deslumbrantes, segurança, comidas saborosas, transportes rápidos e principalmente, meio ambiente. E, num processo de lentidão similar ao de uma preguiça paraplégica, chegou à conclusão óbvia que tudo isso é uma utópica ilusão. Pois, os milhões de carros transitando nas ruas e estradas causam desastres físicos e ecológicos, congestionamentos nas horas mais importantes, as comidas condimentadas e gordurosas são venenos para corpo, os telefones (principalmente os celulares) sempre estão falhando ou nos localizando nos lugares indevidos, as televisões, rádios e jornais mentem e são tendenciosos. Enfim, que é uma verdadeira merda a vida na cidade. Principalmente nas grandes metrópoles, onde além dos tormentos existentes, você ainda está passivo de ser assaltado, seqüestrado, morto por uma bala perdida ou por algum policial querendo mostrar serviço (provavelmente para algum traficante).
Que fazer então?
Claro que voltar às origens! E, pensando nisso, um amigo meu já comprou um pedacinho de terra na Chapada Diamantina, mais precisamente em Igatú, e está agilizando a construção de uma casinha estilizada no alto de uma montanha, onde pode vislumbrar a mata selvagem, o céu azul durante o dia e o luar estrelado a noite. Passear durante o dia nas picadas com direção as rústicas quedas d’água, encontrar dormindo no caminho algumas cobrinhas inofensivas ou não, ouvir os pássaros cantando com naturalidade e desenvoltura, ao tempo que vai respirando um ar mais puro e limpo do que bolso de professor. E ainda matando os mosquitinhos nativos que atacam ávidos para saborear o sangue novo na praça.
Só em chegar ao destino, poder parar e não aparecer, misteriosamente, um flanelinha dizendo: “Pode deixar que eu tomo conta, doutor!” Vale fugir de qualquer cidade.
Acho que meu amigo está certíssimo em tomar essa correta atitude. Posso até aderir tal comportamento, mas, se eu não tiver ao meu lado uma maravilhosa mulher para me tentar e atentar, não serei capaz de mudar, radicalmente, meu habitat. Isso com direito a trocas eventuais para quebrar a rotina. Pois, depois de determinado tempo convivendo com a serenidade local, a variação de diálogos terminará sempre com os mesmos temas e, infelizmente, essa permuta torna-se essencial para ambos. Claro que na cidade grande nosso grau de tolerância é muito mais ampliado, pois não temos nem tempo de conversar em função do labor durante o dia e a tv durante a noite.
Não quero que pensem que sou um maníaco sexual de maneira nenhuma, mas, viver nesse paraíso sem uma Eva anual, prefiro morrer estressado nas loucuras das cidades.
Vou providenciar a compra de meu pedacinho do céu em Igatú, procurar minha parceira temporária, arrumar os meus paninhos e voltar as minhas origens gritando bem alto: Adeus civilização ingrata!

*Escritor (Vida Louca – ansouza_ba@hotmail.com)

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