Antonio Nunes de Souza*
Tudo
começou quando um dia eu fui a uma feira livre na minha cidade e, mesmo sem ter
interesse, parei em uma barraca que vendia passarinhos diversos. Tinham
canários, Cardeais, um papagaio e muitos Papa-capins, Fiquei observando, o
feirante que estava acompanhado com uma criança, me perguntou: A senhor a deseja
algum pássaro?
-Não,
obrigado. Apenas estou admirando e com pena de vê-los presos!
-Eu
também tenho. Mas, as pessoas gostam, e é uma maneira que tenho de ganhar algum
dinheiro, para me manter com meu pequeno filho!
Fiquei
olhando a criança sentada num tamborete, vestida com uma roupinha surrada,
chinelos gastos e na mão um beiju de mandioca, que ele comia se lambuzando com
os farelos, e do nariz escorria dois rastros de catarro, que ele às vezes
sugava e as secreções voltava para as narinas. Uma ação características das
crianças, quando as mães não cuidam!
Me
sensibilizei bastante e perguntei: Por que o senhor não deixa a criança em casa
com a mãe?
Minha
mulher morreu de parto e eu crio Rafael desde que nasceu, já está com quatro
anos, e, infelizmente, não tenho condições de cria-lo decentemente, devido
minha situação de trabalhador de roça, e durante a semana coloco armadilhas e
pegos esses pássaros, para ajudar nas despesas. Gostaria de entregar ele a uma família,
para que pudesse ter um futuro!
Ao
ouvir suas palavras, loucamente falei: O senhor me daria ele para ir morar em
minha casa? Eu moro com minha mãe, estou estudando, e minha mãe é funcionária
municipal, e não alterará nada em termos de maiores despesas!
Ele
deu um sorriso e disse de estalo: Você é uma menina (eu tinha treze anos) que
precisa de alguém para acabar de lhe criar, como é que você quer criar alguém?
Me
chamar de menina, buliu nos meus brios, e eu, novamente loucamente, falei: Se
minha mãe vier aqui e se responsabilizar, o senhor permitirá?
-Traga
ela aqui para conversarmos. Falou isso como não se não estivesse me dando
nenhum crédito!
Simplificando,
eu digo que fui, briguei e discuti, mas, depois de um longo tempo, ela se predispôs
a ir na feira, conhecer o homem e ver a criança, já que ela também era muito
humanitária e solidária. O fato é que depois de conversas e acertos, o homem
indo ver nossa casa, anotar endereço, ver que minha mãe era gente conhecida,
cedeu a guarda do lindo menino Rafael, assim registrado com paternidades!
Claro
que com minha intempestiva atitude, as rotinas da casa foram todas mudadas,
principalmente, ter que deixar Rafa com a vizinha todas manhãs, já que eu tinha
de ir para o colégio, terminando meu curso secundário. Mas, com jeito, a
vizinha que era uma senhora que morava só, ficou deslumbrada de alegria, por
ter essa companhia diária!
A
verdade é que o tempo foi passando, Rafa foi crescendo, estudando, chamava
minha mãe de mãe e a nossa vizinha de avó, e nós éramos como irmãos. Até que
chegou a minha formatura em odontologia, eu com vinte e dois anos, e Rafa já
com treze, a mesma idade que eu tinha quando o conheci e, curiosamente, ele
estava hoje cursando o secundário. Foi a maior festa, com muita alegria. Minha
mãe, conseguiu que um dentista amigo me deixasse usar uma cadeira vaga em sua
clínica, e eu daria vinte por cento da arrecadação mensal dos serviços
efetuados por mim. Vibrei de felicidade, pois, isso representava o começo da
minha independência profissional!
Eu
e Rafa éramos unhas e dedos, sempre amigos, mesmo ele sendo nove anos mais
jovem!
Mais
uma vez, ao passar do tempo, com minha ajuda e influência, chegou a formatura
de Rafael, sabem em que profissão? Dentista!
Minha
mãe orgulhosa e feliz, chorou de emoção, lembrando-se do dia em que eu, numa
ação absurda, a levou para buscar aquela criança, que hoje era o seu orgulho e
alegria!
A
essa altura eu já tinha meu consultório, e logicamente, aluguei uma sala
vizinha, fiz uma adaptação e coloque toda instrumentação e uma linda cadeira
para meu adorado Rafa. Lógico que trabalharíamos juntos nessa clínica, que
coloquei o nome de Previdente Assistência Odontológica!
Sempre
unidos, trabalhando juntos, muito amor e afetividade durante tantos anos, que tudo
isso reunido, logicamente transformou-se em amor e
desejos, que normalmente não ocorre entre verdadeiros irmãos. A diferença de
idade, praticamente não era notada, pois Rafa era alto, forte, usava barba e,
sinceramente, parecia até ser mais velho que eu. Minha mãe quase enlouqueceu,
não admitindo dois irmãos estarem namorando. A vizinhança não entendia e
comentavam e malhavam, pois, muitos não sabiam que Rafa apenas foi criado por
minha mãe. Mas, não nos amedrontamos com os comentários maliciosos!
Nos
casamos, somos bastante felizes e, infelizmente, nunca soubemos notícias do pai
de Rafa, pois, sempre eu ia a feira e nunca mais o encontrei!
Posso
aconselhar a muitas mulheres, que ajudem nas adoções, pois, uma delas poderá
ser o seu marido ou um filho, e lhe
fazer feliz. Ser solidário, sempre tem suas recompensas!
*Escritor,
Historiador, Cronista, Poeta e um dos Membros fundadores da Academia Grapiúna
de Letras!
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