terça-feira, 15 de março de 2022

CONVERSA ENTRE AMIGAS!

 

Antonio Nunes de Souza*

-Alô!

-Oi! É Vera querida!

-Diga aí, minha filha. Como vai você?

-Tudo bem. Continuo em Salvador batalhando um “trampo” na área, mas, está duro demais!

-Aqui também a barra está pesada. Trabalho na prefeitura e os salários estão sempre atrasados, além de ser uma merreca retada!

-Consegui um quebra galho de dois meses trabalhando na campanha política, mas, não lhe conto à merda que era!

-Me diga querida, pois deve ter sido bem divertido e agitado!

-Divertido não foi não, porém, bastante agitado e passei as agruras do inferno!

-Me conte...

-Minha amiga, eu tinha de acordar todos os dias às cinco da manhã, me arrumar e tomar dois buzus para chegar ao comitê às sete horas, me apresentar e receber as instruções para que bairro deveria ir, socada dentro de uma Kombi velha desgraçada, com mais de quinze pessoas dentro, uma esfregação da zorra e o motorista picado pelas ruas, pois ganhava por viagens e queria fazer o mais que pudesse. Eu tremia de medo e no meu furico não passava nem pensamento, preocupada com um acidente!

-Pô Amiga! Não foi mole. Verinha você deve ter sofrido bastante, não foi?

-Isso era só o começo mulher! Quando chegávamos ao destino, eles nos entregavam uma bandeira de dois metros e meio, presa em uma vara quase do mesmo tamanho, e mandavam a gente ficar na esquina sacudindo aquela merda de um lado para o outro, os carros passando raspando a gente, e os filhos da puta ainda diziam piadas e sacanagens. Não tínhamos direito de sair do posto determinado para nada. Nem pra fazer xixi, pois, não tinha nem lugar para isso. Às vezes quebrávamos o galho em algum barzinho camarada, quando o fiscal do partido dava uma sopa!

-Ainda bem que devia ser um turno só!

-Você tá brincando! A zorra ia até a noite que, quando chegava ao fim da tarde, eu nem mais sentia os ombros e os braços que estavam dormentes. Uma fome retada, pois eles traziam um cachorro quente e um suco, entre meio dia e uma hora, que era o nosso almoço. O que nos alimentava e dava forças era a promessa que se o homem ganhasse, todo mundo estaria empregado numa boa. Para quem está na pior, tem que se apegar a qualquer conversa e pedir a Deus que aconteça!

-Também, quando dava a noite, você se picava pra casa e ia descansar legal!

-Ah! Ah! Ah! Você tá brincando comigo minha filha! A noite que era que acontecia a tragédia pior. Pois, no fim do expediente, os descarados dos cabos eleitorais, escolhiam as mais bonitinhas e nós tínhamos que sair com os caras para transar. E quem se recusava era despedida na hora sem a menor cerimônia. Era o verdadeiro “ou dá ou desce”. E eu com essa bundinha arrebitada era sempre escolhida quase toda noite, e, depois de passar o dia segurando no mastro da bandeira, tinha de sentar no mastro de um cabo eleitoral, e ainda fazer cara que estava feliz. Imagine como eu chegava em casa, quase meia-noite, e tendo que levantar as cinco, Mas, pensando no emprego futuro, me submetia a essa situação toda sem chiar. Para me consolar intimamente eu pensava: tudo pelo social!

-Ka! Ka! Ka! Desculpe estar dando risada querida Vera, mas, embora sacrificante, não deixa de ser engraçada essa aventura!

-Engraçada para você que não passou por esse tormento!

-Espero que agora, depois dessa experiência desgraçada, você possa desfrutar do seu emprego numa boa, e compense o sacrifício feito!

-Aí que vem a pior parte! O filho da puta perdeu a eleição, não vão pagar os nossos salários do último mês, e não vai ter emprego para ninguém. Nunca mais vou cair em conversa de fazer campanha, a não ser por idealismo e com liberdade de ação!

-E na área da sua formação, não tem aparecido nada?

-Minha filha o povo está tão louco, composto de fodidos e desempregados, que nem podem, nem reconhecem que as soluções dos problemas da mente podem ser contornadas através da psicologia. Eu devia era ter estudado medicina!

-Depois eu lhe conto sobre minha vida. Desligue para não acabar com seu crédito. Bateremos um papo no Facebook que é 0800. Lembranças para essa turma legal aí do bairro Castelo Branco!

-Um beijão querida!

-Tchau Verinha querida!

*Escritor – Historiador - Membro da Academia Grapiúna de Letras - AGRAL

 

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