quarta-feira, 21 de fevereiro de 2024

AMOR DEMAIS TIRA A PAZ! (Clique no título e leia)

 

Antonio Nunes de Souza*

-Sempre guardei segredo desse triste fato, mas, com o passar do tempo Raimundo, por você ser meu melhor amigo, resolvi contar-lhe uma enorme tristeza e decepção, que sofri há muitos anos!

-Nada Luiz, deixe de tolices, todos nós temos nossas tristezas e é sempre bom desabafar para aliviar a consciência!

-Aconteceu o seguinte: Quando eu tinha vinte e três anos, deixei a faculdade e resolvi trabalhar. E meu primeiro emprego foi de representante comercial, que naquela época era chamado de cacheiro viajante, ou simplesmente, viajante. Viajava por todo Estado da Bahia, fazendo pedidos para uma fábrica de tecidos bem famosa, chamada Bangu, que hoje não mais existe. E ganhando bem, como já vinha namorando com Karla há uns meses, resolvi casar, já que sou, praticamente, sozinho, uma vez que minha família toda mora no Maranhão, e eu foi que vim para cá aventurar a vida, seria interessante constituir minha própria família!

-Casei-me aluguei e montei uma casa um tanto simples, mas, com todo conforto necessário. E continuei fazendo minhas viagens, sempre retornando, rigorosamente de quinze em quinze dias, para dar assistência a família. Porém, aconteceu o seguinte: Como eu ia muito a Vitória da Conquista, terminei arranjando uma namorada lá de nome Irene, e me apaixonei pela danada. E como me apresentava como solteiro, resolvi casar com ela apenas no religioso, como se fosse em caráter experimental, ela concordou, alugamos um apartamento, fizemos uma festinha simples, a falta de minha família foi justificada, pois, o Maranhão é muito longe, etc., e fomos morar juntos na maior lua de mel!

-Ela já sabia que eu viajava muito e que somente viria uma vez por mês para passar três ou quatro, no máximo uma semana. Ela disse que sentiria saudades, mas, se conformaria por me amar muito!

-Aí meu amigo, comecei a viver uma vida dúbia, dividindo meu tempo com Karla, Irene e meu trabalho. E, para não falhar com nenhum dos três compromissos, fiz uma tabela que, rigorosamente, eu obedeceria: do dia primeiro ao dia onze eu trabalharia dobrado em várias cidades, para atingir minha cota, dia doze ao dia vinte e seis com Karla e fazendo a praça de Salvador, e de vinte sete a trinta, ou trinta e um com Irene, que era mais conformada com a pouca e saudosa presença!

-Porra cara! Que ginástica filha da puta! E como você se saiu dessa?

-Você vai saber agora. Essa situação durou um ano meu amigo, eu cumprindo rigorosamente minha tabela, quando chegava era a maior alegria, prato especial para um jantar de recepção, etc., era uma despesa grande cuidar e manter duas casas e duas mulheres, se bem que Irene trabalhava, aliviava meus gastos e ajudava pagando luz, água e telefone, além de se calçar e vestir sem me dar despesas!

-Aconteceu que um dia vinte e cinco eu estava em Salvador e me deu saudades de Irene, então resolvi fazer uma surpresa e fui para Vitória da Conquista, chegando lá as vinte e uma horas, passei no shopping, fui numa floricultura, comprei uma dúzia de rosas, e fui para casa fazer minha surpresa. Cheguei, parei o carro meio distante, abri a porta em silêncio e fui de pontinha de pés até o quarto. E meu amigo, aí é que foi a merda. A porta estava entreaberta eu pude ver um homem deitado e Irene nua em cima dele, rebolando e gemendo. Me deu vontade de entrar e matar os dois, mas, me refiz do susto, e como cheguei, voltei em silêncio, saí, peguei o carro e segui para o centro, sendo que no caminho joguei as rosas pela janela do carro e fui direto para a estrada, pensando em voltar para Salvador, me consolar e aliviar meu desgosto ao lado de Karla. -Cheguei em Salvador o dia começando a clarear, morto de cansado, cabeça doendo e cheio de raiva e ódio. Segui direto para o bairro Nazaré onde moro. Aí, quando me aproximava da minha casa, vi um cara saindo, Karla na porta lhe deu um beijo na boca de despedida, e ele sorridente deu com a mão e seguiu, mas, deu para eu ver que era nosso vizinho de duas casas adiante. Eu pensei logo: Puta que pariu! Ser corno duas vezes no mesmo dia? Não é possível meu Deus!

-Como tenho um tremendo sangue frio, dei meia volta, fui a um bar que estava abrindo naquela hora, entrei, tomei café, fumei uns quatro cigarros, e já eram sete horas. Fui para casa, entrei e dei uma desculpa da minha volta, nada falei, muito embora notei que ela tomou o maior susto com minha presença, imagino que pensou: Porra! Por um triz eu não fui pegada em flagrante!

-Falei que ia dormir para descansar, ela rapidamente mandou que eu esperasse que ia mudar a roupa de cama. Presumo que devia estar cheia de manchas de esperma. Esses pensamentos me deixavam fodido e revoltado. Deitei, demorei pra caralho para dormir, mesmo estando cansado, e aproveitei para pensar e fazer uma reflexão sobre toda situação. Cheguei à conclusão que na verdade, o culpado e mais errado fui eu que, absurdamente, quis ser um homem duplo familiar, enganando duas pessoas que diziam que me amavam!

-Que coisa bárbara e incrível Luiz. Nunca vi isso nem no cinema, nem em novelas de televisão!

-Providenciei minha separação com Karla, alegando que tinha meus motivos pessoas, e por questões de trabalho, ela também não fez nenhuma objeção, nos divorciamos consensualmente, nada tinha para divisões, e as coisas da casa deixei para ela! Peguei minhas coisas e fui para um hotel e, com três dias resolvi deixar o emprego e vir morar aqui em S. Paulo e recomeçar minha vida. Com relação a Irene eu nem dei satisfação. Nunca mais fui lá, o apartamento alugado era no seu nome, ela ganhava bem e, com certeza, não teria dificuldades. Eu era jovem, apenas vinte e oito anos, não seria difícil me refazer, como não foi. Trabalhei bastante e tenho hoje uma modesta, porém, sólida empresa, que me dá uma condição de vida relativamente boa!

-Eu estou completamente assombrado com essa inusitada e trágica história. Não sei como você, meu amigo já há vinte cinco anos, nunca tocou nesse assunto, nem nessa parte da sua vida. Agradeço a sua confiança e vi que você mudou da água para um bom vinho, pela família que construiu aqui com minha comadre Martha, e seus três lindos adolescentes filhos!

-Eu hoje Raimundo, aconselho a todos os homens que, se não poderem ser santos, que também não sejam diabos!

*Escritor, Historiador, Cronista, Poeta e um dos Membros fundadores da da Academia Grapiúna de Letras!

Um comentário:

Anônimo disse...

Já dizia minha mãe quem tudo quer tudo perde kkk