Antonio Nunes de Souza*
Às
vezes andando na rua, paramos em certo trecho da cidade e, magicamente, voltamos
ao passado, relembrando coisas boas e loucas que fizemos, que se tornaram
inesquecíveis!
E
foi o que aconteceu comigo, passeando na beira do rio cachoeira. Sentei-me num
banco e comecei a passar o meu filme mentalmente, sendo que começou a projeção
aleatoriamente, com uma passagem que, infelizmente, não me deixa nada lisonjeado!
No
sul do país, onde fui aventurar a vida, meu primeiro trabalho foi como auxiliar
de camelô. Eu ficava na roda como um estranho, ele pedia um voluntário para
fazer uma mágica, aí, dois também do esquema, apontavam para mim, eu fazia
aquele drama que não queria, e o povo logo gritava: Vai, vai, vai, e eu todo
contrariado, ia para o centro da roda já com os resultados das mágicas nos
bolsos. Ele realizava, o povo aplaudia e logo em seguida passava a venda dos
milagrosos remédios. Terminando tudo, no fim do dia, eu recebia minha diária e
seguia para um miserável quartinho, que vivia com minha mulher e dois filhos.
Então...veio logo em minha mente, que em vez de auxiliar, também poderia ser
camelô, já que com um mês já sabia todas as tretas e segredos dos remédios!
Peguei um dinheirinho que tinha de reserva, comprei os apetrechos necessários,
combinei com a mulher para que ela fizesse os remédios, que consistiam em sabão
massa, anilina azul ou rosa, e ela derretia o sabão com a anilina, colocava em
forminhas, papel de seda para a embalagem, completando com um rótulo do peixe
elétrico da Amazônia, com os dizeres que servia para dezenas de doenças, e licenciados
pelo Ministério da Saúde. O óleo era de soja por ser mais barato, colocados e
rotulados em frasquinhos de penicilina. Eu dizia na roda que era representante
da fábrica, e vendia a preço de custo!
Na
primeira semana, foi fraquíssima, pela minha pouca experiência, como também
faltava algo que atraísse a plateia para ser criada uma grande roda. Aí, por
sorte, um velho camelô que estava se aposentando, me vendeu a sua jiboia velha,
gorda e preguiçosa. Fiquei na maior alegria, mas, quando cheguei em casa, a
mulher deu o maior chilique, ter que dormir 4 num quarto apertado, e ainda com
uma cobra? Mas, com palavras e carinho, a convenci que ali estava o nosso
futuro! Dia seguinte, peguei as malas, a dos remédios e a da cobra, levei
comigo o sobrinho da dona da pensão para me ajudar, tomamos o ônibus direto
para praça. Chegando armei minha arapuca de pegar otários, e comecei a gritar
convidando para que fossem ver a grande serpente das selvas, que eu tinha
capturado na colheita das ervas medicinas, para misturar ao óleo do peixe
elétrico, formando um bálsamo capaz de curar da dor de cabeça até tumores cancerígenos,
dor de barriga, gripe, azia, dente, espinhaço, vertigens, etc., essas eram
curadas apenas com 4 aplicações. Já as coceiras e doenças de pele, com 3 banhos
tudo desaparece. Fora 3 gotas do óleo puro em meio copo de água, tomados por
uma semana, o desejo sexual aumenta de tal for forma, que precisa você refrear
seus desejos, senão vai querer ir pra cama toda hora. Dito essa ladainha, com a
desgraçada da cobra pesada nos meus ombros, eu e meu auxiliar pegamos os
remédios e fomos oferecendo sendo 1 é quatro e 3 é 10. Fomos vendendo uma boa quantidade.
Como o povo vai mudando, meu auxiliar passou a fazer parte da plateia, eu
repito meu babado e, para causar impacto, pergunto: Tem alguém aqui na roda com
dor de cabeça? Aí meu secretário se apresenta, todos ficam na expectativa, eu
passo o produto em sua testa, pingo uma gota de óleo em sua boca e, com dois
minutos pergunto: Como está agora? E ele cinicamente diz: Não estou sentindo
mais nada, que coisa maravilhosa. Me dê aí 3 fracos para eu levar para meus
familiares. Aí eu digo: Eu vou lhe dar de cortesia, mas, você vai me ajudar a
vender aos clientes. Certo, eu topo. Então, começamos outra vez enganar os bobos,
vendendo nossos falsos remédios. Foi um dia ótimo, vendi quase 300 cruzeiros (dinheiro
da época), paguei ao rapaz, passei numa padaria e comprei um frango assado. Cheguei
em casa causando a maior alegria pelo jantar que teríamos, já que normalmente
era um café preto com pão sem manteiga!
As
lembranças continuarão, pois são muitas e divertidas, mas, aguardem que contarei
outra em breve!
*Escritor,
Historiador, Cronista e poeta!
Um comentário:
Bom Dia Antônio . Suas divertidas lembranças alegram meu coracao
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