segunda-feira, 24 de março de 2025

NEM SIGMUND FREUD EXPLICARIA! (Clique e leia)

Antonio Nunes de Souza*

Se existem coisas inacreditáveis nessa louca vida que vivemos, uma delas é a que passo a contar, através de uma crônica leve um fato inesperado que, fantasticamente, mudou a vida de Hélio, que tinha o apelido interessante de “trem”. Fiquei curioso com a razão do apelido, pois, ele era bem apessoado e simpático, e me informaram que assim o tratavam, pois, mesmo morando no morro, pobre e sem sorte, já com 20 anos, jamais deixou de andar na “linha”. Achei genial a inteligência de quem colocou esse justo apelido, que cabia como uma luva!

Hélio trabalhava como aquele cara que “faz tudo” que aparece, de coisas honestas e dentro das leis, como: ajudante de pedreiro, carregador, compras para famílias, levar e buscar meninos nas escolas escola, ajudante de feirante, etc.

E, com essas atividades, cobria suas despesas e estudava a noite, conseguindo fazer um curso secundário com qualificação, já que se esforçava em tudo que desejava, ou fazia nas profissões que, esporadicamente, exercia. Esse era seu comportamento desde que chegou de Pernambuco, num “pau de arara”, sozinho e sem família, com apenas 14 anos!

Um belo dia, sr. Almeida, dono da única casa lotérica do morro, vendo que ele era um rapaz que desejava subir na vida e bastante correto, o convidou para que ele fosse vender bilhetes da Loteria federal nas ruas, que além de ser um trabalho mais qualificado, a comissão lhe daria um rendimento bem melhor que os trabalhos que fazia, pois, havia dias que nada aparecia, e ele tinha até ter dificuldade para sua alimentação. Depois de meditar e ser convencido por Almeida, que estava querendo ajuda-lo, resolveu aceitar, ficando acordado que ganharia 10% recebendo no fim do dia na hora da prestação de contas. Almeida foi incisivo quando disse para ele, que teria que se apresentar duas horas antes da corrida e, caso não fizesse, teria que pagar e ter que bancar os bilhetes que estavam sobre sua responsabilidade. Essa parte foi bem ressaltada, pois, não haveria perdão no prejuízo. Mesmo com certo medo, aceitou, já que Almeida disse que seu vendedor anterior ganhava bem e não tinha o gabarito que ele tinha.

O fato é que Hélio melhorou de vida, mudou-se para um quarto numa pensão, passou a fazer cursinho para vestibular e ter seus namoros com várias moças, já que circulava por toda periferia e algumas outras áreas urbanas. Até aí tudo eram flores, mas, um dia daqueles que os azares aparecem, umas horas depois que estava circulando para suas vendas, veio uma moto em velocidade e o atropelou, fazendo com que desmaiasse. Chamaram o SAMU, pegaram sua pasta e foi levado para o hospital. Como tinha sofrido alguns arranhões, porém, nada grave, deram-lhe uns sedativos, o colocaram no soro e deixaram que ele dormisse e descansasse para depois lhe dar alta.

Foi quando aconteceu o trágico da coisa, pois, quando ele acordou, já tinha passado da hora da prestação de contas e, pagar os bilhetes daquele dia iria consumir todas suas pequenas economias para pagar as despesas mensais. Pegou seu celular, tinha umas 3 chamadas de Almeida, então ligou para o patrão dizendo o acontecido. Almeida lamentou, mas, foi enfático ao dizer que, infelizmente, ele teria que pagar os bilhetes levados, pois, a corrida seria dentro de uns dez minutos. Hélio não contestou, deixou para acertar um parcelamento, em função dele ser um vendedor exemplar, e foi um acidente de percurso que ocasionou sua falha!

Para finalizar a história inusitada, um dos bilhetes que estava em sua mão inteiro ainda, deu no primeiro prêmio, e Hélio ganhou R$ 650.000,00 (seiscentos e cinquenta mil reais). Pagou a Almeida os bilhetes, mudou-se para um quitinete na cidade, aplicou o seu dinheiro, continuou seus estudos, e hoje é um professor com mestrado e sempre vai na lotérica de Almeida para visita-lo, e agradecer a oportunidade dada. Procurou muito o motoqueiro que lhe atropelou para presenteá-lo e agradecer a ironia do destino, mas, nunca conseguiu encontrar!

Se formos analisar religiosamente esse fato, os iludidos cristãos dirão que: “Foi coisa de Deus, que escreve certo por linhas tortas”. Mas, se o bilhete não fosse premiado, e Hélio ficasse aleijado, eles diriam: “Foi obra do Satanás.” Para tudo eles tem uma justificativa, pois, são uns conformados e subservientes aos superados dogmas celestiais!

*Escritor, Historiador, Cronista, Poeta e um dos membros fundadores da Academia Grapiúna da Letras!


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