terça-feira, 25 de dezembro de 2012

Minha morada no subúrbio!


                                              Antonio Nunes de Souza*

Tive a desdita de ir morar num subúrbio desgraçado e, por mais que possa exagerar, não conseguirei dizer as coisas bárbaras que presenciei, tendo às vezes de participar, involuntariamente, somente por estar presente na hora que os fatos estavam ocorrendo. Foi uma fase passageira, mas, foram onze meses inesquecíveis, pois é um lugar onde todos se conhecem, se preocupam em demonstrar que uns são melhores que outros e, pela educação e cultura serem pouco desenvolvidas, os “barracos” são armados por qualquer coisa, transformando-se em gritos e bate bocas, muitas vezes em pancadarias com a participação de todos os familiares. Até aqueles que professavam as religiões evangélicas, com seus vestidos longos e sem decotes, caminhando com suas Bíblias nas mãos, camisas de mangas compridas, gravatas e palitós curtos e desbotados, quando aparecia uma motivação de desagravo, partiam para a agressão sem a menor compaixão e, em nome de Jesus, largavam a porrada em seus adversários, como se fossem demônios e capetas em plena função do mal. Havia uma diversidade de religiosidades, com uma expressiva quantidade de adeptos da macumba, catolicismo, candomblé, espiritismo, umbanda e outras que variam sobre esse mesmo tema. E até algumas com princípios e manifestações orientais!
Tive como vizinho, um casal que brigava todos os dias, pois Salvador era um namorador terrível, e sua querida Doralice sentia um ciúme do homem desgraçado e cheio de defeitos que, se fosse um carro a fabrica para fazer um “recall” nele, seria mais prático uma substituição completa e considerar perda total!
Eu tinha trinta anos, recém chegada do interior, solteira e sem profissão específica, somente a vontade de batalhar e um corpo e carinha bonitinhos que ajudam em algumas circunstâncias. Meu projeto principal era fazer uma faculdade e, para tanto, estava pronta para enfrentar qualquer porra que fosse necessário. E, como disse, enquanto nada aparecia, passei a me vestir bem e freqüentar os shoppings no fim da tarde, pensando, realmente, em fazer programas que me trouxessem boas remunerações. E foi mais fácil do que eu esperava, pois sempre haviam executivos de meia idade que, após seus expedientes, iam em busca de aventuras amorosas, cujos cachês nada significavam ou abalavam suas finanças. Mas, para mim, eram significativos e me mantinham numa vida tranqüila e sem problemas com as despesas. O negócio passou ser tão bom que, muitas vezes, eu fazia dois ou três programas num dia e sendo o mínimo cem reais cada, passei a ter uma renda invejável. Foi aí que saí do subúrbio indo morar em um AP quarto e sala muito bem mobiliado, dando-me mais status e condições de receber meus clientes, podendo cobrar melhor meus desempenhos e a segurança que não havia nos motéis. Passei a ser uma empreendedora que, vontade me deu de procurar o Sebrae e, com sua ajuda, abrir umas franquias ou filiais. Percebi que uma xoxota bem administrada, vale ouro. E, barriga de tanquinhos, só servem para fazer produção independente e se picarem nos deixando com a carga nas costas!
O fato é que, depois de dois anos nessa atividade lucrativa e agradável, pois você lida com pessoas inteligentes, bem tratadas, educadas e com situações financeiras definidas, minha vontade de fazer faculdade foi por água a baixo, comprei um carro, dei entrada num apartamento de dois quartos e, juro por Deus, ainda tenho uma poupança com algumas economias. Tenho que explicar que devo tudo isso a uma clientela de sessentões que dou um tratamento de rei e, sempre que desejo algo mais, eles me dão sem nem exigir mais nada em troca e nem as idiotas exclusividades. Entretanto, agora que estou com quarenta e um anos, estou parando gradativamente e, sabem o que vou fazer? Vestibular para direito!
Darei um descanso a minha “perseguida” que trabalhou sem nunca me causar constrangimento, farei a tão sonhada faculdade e, a partir daí, viverei uma vida mais discreta, apenas tendo umas aventuras eventuais no sentido de manter o padrão de subsistência. Não quero com isso incentivar ninguém a fazer o que fiz, pois, nem sempre dá certo, mas, é bom que saibam as tolas moças de hoje que, quando se sabe usar o corpo com inteligência e prudência, pode-se alcançar os objetivos tendo uma vida com certa normalidade, pois essa rachadura frontal é gloriosa e lavou está nova em folha! E agora ainda conta com a ajuda da bunda e o boquete, tão solicitados e valorizados entre as quatro paredes!

*Escritor (Blog Vida Louca – antoniomanteiga.blogspot.com – Antoniodaagral26@hotmail.com)

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