segunda-feira, 5 de dezembro de 2022

O DIA EM QUE PAPAI NOEL CHOROU!

 

Antonio Nunes de Souza*

Aproveitando o gancho do livro alusivo ao grande e irreverente filosofo Friederich Nietzsche (O dia que Nietzsche chorou), resolvi escrever um texto sobre fatos que devem ocorrer no andamento dessa vida louca e desigual, que temos o prazer de vivenciar, mesmo lutando pela sua melhoria, encontrando em nossa frente pedras humanas e políticas, egoísticas e sem sentimentos coronários!

Mendonça, aposentado com seus sessenta e três anos, porém, ainda com vitalidade e saúde para desempenhar uma atividade, principalmente para aumentar seus parcos rendimentos, viu no jornal uma nota procurando senhores para fazer o papel de Papai Noel em um shopping, sendo preferência que tivessem as qualificações e perfil do bom velhinho (Cabelos e barbas brancas, corpo avantajado e bastante educado na sua desenvoltura para atender os pais e as crianças). Sorriu ao ler o anúncio, se imaginando naquela função, já que, curiosamente, enquadrava-se completamente no papel, inclusive já era apelidado pelos velhos amigos, com o nome do rei dos presentes!

Apresentou-se, fez entrevista, foi submetido a um rápido exame médico e, como esperava, foi logo contratado para ficar sentado num belíssimo trono no meio da decoração natalina, atendendo a grande clientela ávida de vê-lo, fotografá-lo e fazer os seus sonhados pedidos. Pela premente necessidade, ficou combinado que já começaria no dia seguinte, ficando o resto do dia para providências relativas aos ajustes das roupas e outros pequenos detalhes! Não deixou de pensar, que para não ser sacaneado pelos amigos, nada falaria, e com certeza, não seria reconhecido depois da roupa vermelha, chapéu, alguns enchimentos corporais e o saco nas costas.  Seriam três, cada um com o período de seis horas e ele escolheu das 12 as 18 horas, para preencher suas tardes sem atrapalhar suas duas novelas!

Dia seguinte, cedo se apresentou a equipe responsável pela caracterização, e com meia hora, estava parecendo que tinha acabado de chegar do Pólo Norte, faltando apenas o trenó e as renas. Foi levado para o seu lugar, sentou-se em uma larga e confortável poltrona, colocou o saco de pretensos presentes ao lado, ficando no aguardo da sua singela e maravilhosa clientela. Quase que imediatamente, começaram a despontar pais cheios de orgulhos, direcionando seus curiosos filhos para o colo de Papai Noel, para que fossem fotografados, e obviamente, fazer os seus pedidos. Foi nesse momento que Mendonça sensível, solidário e humano, começou a sofrer ouvindo de crianças pobres e sem condições, pedidos de computadores, bicicletas luxuosas, celulares, brinquedos elétricos e eletrônicos, bonecas que falam, cantam e se movimentam como seres vivos, etc. Ninguém pedia roupas ou livros, não tinham consciência das condições financeiras dos seus pais, que deixavam transparecer em seus rostos, a impossibilidade de atender a grande maioria deles, já sofrendo por ter que ver as frustrações no dia de Natal!

Já fragilizado com o que se passava em sua mente, em função dos pedidos que ele sabia e sentia que não seriam atendidos, uma garotinha de uns seis anos, com uma aparência bastante pobre, chegou ao seu ouvido e disse: Papai Noel, em vez de você me dar presente, diga a Deus para cuidar da minha mãe que está muito doente. Não se esqueça, viu?

Foi nessa hora que Papai Noel chorou, abraçando a garotinha, sem poder conter as lágrimas que desciam em sua face. No fim do expediente, indignado e triste por comprovar a injusta distribuição de renda, a falta de solidariedade humana mesmo na maior festa da cristandade, dirigiu-se ao setor pessoal e pediu sua imediata demissão!

*Escritor, Historiador, Cronista e Poeta!

Nenhum comentário: