terça-feira, 14 de setembro de 2021

A DESPEDIDA!

 

Antonio Nunes de Souza*

As pessoas que gostam de escrever e supõem que sejam providas de imaginação fértil, geralmente procuram criar algo em suas mentes e, muitas vezes, terminam saindo coisas totalmente estranhas, porém, ligadas a realidade do cotidiano da vida!

Como sou uma dessas pessoas, veio-me a cabeça a ideia de como seria uma despedida honrosa e detalhada de um tranquilo suicida. Digo tranquilo porque, nem sempre, como todos pensam, quem pratica o suicídio está nervoso ou desesperado. Muitos estão com os pensamentos em ordem e procedem com a convicção de estarem agindo corretamente, para o seu bem e de todos que o cercam!

Contudo, para não ter que criar uma estória totalmente irreal, resolvi por no papel exatamente como seria a minha espontânea morte, caso eu estivesse nesse momento com vontade de cometer tal atitude. Muito embora, pela cabeça de todos nós, sempre passa em algum momento, o desejo de desaparecer para o mundo, deixando para trás os aborrecimentos, tristezas e chateações, que somos agraciados no nosso dia/dia. Mas, quando as coisas melhoram e as soluções milagrosamente aparecem, sempre dizemos: Que ideia mais tola eu tive!  Contudo, somente uma minoria, considerada por grande parte da humanidade como totalmente louca, chega a praticar tal atitude sem que tenha uma justificativa coerente, satisfazendo apenas a sua momentânea e mórbida vontade, tendo a convicção que a sua vida lhe pertence e corajosamente, faz dela o que desejar, sem dar bolas as conjecturas posteriores!

Eu, particularmente, jamais considerei um louco aquele que, sem pestanejar, transfere-se dessa para a outra, livrando-se definitivamente e fisicamente dos problemas e angústias, que para ele parecem insolúveis, ou esta seja a solução mais adequada!

Se analisarmos religiosamente, este ato de morrer (naturalmente, ou não), ocasião em que partimos para a tão sonhada “vida eterna ao lado de Deus”, logicamente, esta pessoa está fazendo um altíssimo negócio. Principalmente por ser uma troca de locação muito mais confortável e garantida, que viver diariamente atormentado e ladeado de pessoas indesejáveis, enfrentando o acúmulo de aborrecimentos, sem contar as desnaturadas debilitações ocasionais, ou constantes da sua saúde. Claro que pela cabeça de quem está bem com a vida, jamais passa a ideia de partir desta tão cedo, para ir atrás do desconhecido.  É raríssimo, mas, acontece!!

A verdade é que aquele que não está satisfeito, ou até está, mas, acha que já viveu o bastante, tem todo direito de ir para onde lhe pareça mais conveniente, da maneira e hora que achar mais adequada e, corajosamente, se desliga de tudo e, tranquilamente, faz o que deseja. Inclusive, para poupar a surpresa de ter que morrer numa ocasião em que seu gosto é totalmente contrário. Você já imaginou desejar viajar hoje e a natureza dizer que só daqui a alguns anos?  Ou você dizer que não quer ir e a natureza embarca-lo sem dó nem piedade?  Essas atitudes vão de frontal encontro a famosa e indiscutível lei do livre arbítrio!

 E será que existe melhor lugar, que aquele onde se tem uma vida eterna, longe da luxúria, inveja, preconceito e o amor é abundante?

Duvido que exista!  A não ser que as religiões estejam erradas e, ao longo dos séculos, venham nos pregando essa peça, que ninguém tem oportunidade de voltar para contar, e nos esclarecer com detalhes. Prefiro acreditar nelas e pensar sempre que quando morrer serei agraciado com tal dádiva. Creio fielmente na bondade divina, inclusive, a capacidade santificada de Deus, em perdoar aqueles que antecipam a sua gloriosa ida, contrariando a ordem celestial.

Mas, voltando ao pensamento sobre meu hipotético suicídio e como procederia em tal situação, vou deixar de filosofar sobre a morte e a vida, e passar a fazer as minhas carinhosas (talvez algumas nem tanto) despedidas!

Para demonstrar minha tranquilidade e, certamente, para que não seja alvo da rotulação de louco ou desesperado, procurarei de antemão, calmamente, relacionar mentalmente as pessoas que realmente merecem que eu perca os meus últimos dias fazendo cartas de despedida, mesmo isso sendo muito mais trabalhoso que fazer uma explicação pessoal, pois, acredito que se assim procedesse, seria interrompido muitas vezes em meu raciocínio, para ouvir as expressões mais lógicas num diálogo desta ordem: Você está louco! Tire essa ideia da cabeça! Nós estamos aqui para ajudar-lhe!

E isso seria intolerante para mim, pois, eu não estou louco, não vou tirar essa ideia da cabeça e não estou precisando de nenhuma ajuda. A não ser para as chatas e cansativas preparações do velório e funeral, e a utilização do tráfico de influência para que não me retalhem numa obrigatória necropsia, procedimento exigido por lei nessas ocasiões. A minha morte, nesse exato momento, faz parte integrante dos meus objetivos de vida. Pode parecer paradoxal, mas, vivi intensamente enquanto pude, chegando hoje a conclusão que devo encerrar a minha participação nesse mundo. E, como dizem que existe outra (e bem melhor), antecipo, gloriosamente, minha ida. Quero ter a tranquilidade de poder dizer que, já que fui responsável por todos os meus atos durante a vida, tive a oportunidade de também ser responsável pela minha morte! Posso até ter o orgulho machista de dizer: Vivi até o dia que quis!  Expressão que só os suicidas têm o privilégio de poder utilizar. Mas, precisa ter peito e coragem para tanto!

 

*Escritor- Historiador- Membro da Academia Grapiúna de Letras AGRAL-antoniodaagral26@hotmail.com-anto0niomanteiga,blogspot.com

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