Antonio
Nunes de Souza*
Eu, menino criado no recôncavo baiano, exatamente na minha querida
cidade de Santo Amaro da Purificação, que considero a de minha natalidade,
pois, num acidente de percurso, meus pais foram passar dois anos em Campinas -
SP e lá nasci e fui registrado, com cinco anos fui para Santo Amaro e vivi
minha infância, juventude, puberdade e até tornar-me adulto, vindo para
Itabuna, e aqui recebi o título de cidadão itabunense por serviços prestados.
Mas, minha terra que tenho a honra, na alma, no coração é meu massapê querido. Vivi
nos velhos idos de antanho, fazendo todas as coisas que ontem e hoje são
condenáveis com referência a alimentação, conseguindo, magicamente, sobreviver
meus longos oitenta e três anos e meio com uma saúde invejável, somente
tornando-me um homem cheio de dúvidas, com relação ao “modus vivendi” do nosso
dito mundo atual de obesos, e gente morrendo fora de dia e hora!
Uma das que mais me deixa pasmo e confuso, é que devo ser um erro
genético, conseguido através de um espermatozoide fora do padrão, que com
autodefesas miraculosas, enfrentou e enfrenta as maiores adversidades,
continuando bem saudável!
Somente para ilustrar claramente o meu relato de confuso ser humano, se
faz mister que cite alguns comportamentos considerados estranhos e absurdos no
passado e na atualidade, que eu, grotescamente, fazia e continuo fazendo alguns,
sem ter a desdita de ser acometido das ferozes doenças da nossa moderna e
conceituada atualidade. Até a Dengue e a Covid eu tirei de letra e escapei!
Já quando engatinhava no quintal da nossa casa, contava a minha tia
Lindaura, que com muito amor me criou, que minha distração favorita era comer
terra. E, por essa razão, ela era obrigada a me policiar constantemente, porém,
esse meu lanchinho eu não dispensava nunca as escondidas. Talvez por isso nunca
tive lombrigas. Provavelmente, elas não gostavam de arenito. No decorrer dos
anos passei a ser um moleque forte e robusto, que mesmo com uma educação
rígida, sempre vivia solto pelas ruas, jogando bola pelas calçadas, e adorava
ir para as feiras livres, assim como faz meu querido amigo e “conterrâneo”
Professor e historiador dos bons, Raimundo Arthur. E, como era um garoto
bonitinho, simpático e sobrinho da dona de uma boa loja na cidade, onde os
feirantes eram fregueses e me conheciam, ficava olhando as montanhas de frutas
no chão com o olhar de desejo e pidão e, facilmente, era agraciado pelos
vendedores com alguma já meio passada, que ele descartava. Sem pestanejar,
imunda mesmo como ela estava, metia na boca e saia comendo, ou chupando na
maior alegria e satisfação. Quando muito, antes de degustar, esfregava na calça
na parte da bunda, imunda por sentar-me sempre no chão, considerando que o
alimento estava altamente higienizado e apto para consumo. Meus passeios e minha
mistura de comestíveis durantes as feiras no cotidiano, era algo maravilhoso e
elogiado por todos que faziam, e eu como um menino criado com cuidados e
atenções especiais adorava!
Não tinha geladeira em minha casa, fui conhecer tal máquina polar, quando eu tinha 12 anos. Quase morro de tanto fazer um
negócio que chamavam de “abafa banca” (nunca soube a razão desse esquisito nome).
Não passava de um picolé feito na fôrma de gelo comum. Eu apanhava qualquer
coisa e fazia o tal do abafa. Até de farinha com açúcar, ou resto de feijão
fradinho amassado com o garfo, que era o nosso liquidificador. Antes desse
mágico equipamento chegar em nosso lar, bebíamos água armazenada em um grande
pote de barro, cheio direto da torneira, ou da cisterna, que retirávamos
através de um caneco de alumínio, sempre amarrado por um barbante e colocávamos
o líquido no copo. Mas, eu quando não tinha ninguém olhando, bebia era direto
no caneco, e o resto ainda devolvia para o pote. Para o almoço colocávamos duas
moringas na janela e na sombra ou no sereno da madrugada, para nos deliciarmos
durante a refeição que, normalmente, era um feijão de mocotó de boi ou porco,
sarapatel, maniçoba, viúva de carneiro, rabada e, curiosamente, muito bacalhau,
que naquela época, era considerada comida de pobre, em virtude das milhares de
barricas que vinham da Noruega após o termino da segunda guerra, através dos
navios cargueiros. Imaginem vocês que era uma ofensa de desdém dizer: “Aquele é
um pobre coitado, comedor de bacalhau com farinha ou salada!” Com essas
comilanças todas, nunca ouvi falar
Para ser sincero, bebi pouquíssimo e raramente, mas, em compensação,
fumei durante 60 anos de minha vida, e estou vivíssimo, boa saúde, ótima
memória, já escrevi doze livros e rabiscos para mais outra dúzia, continuo
escrevendo, fui casado 50 anos com a mesma mulher, que hoje continua sendo
minha amicíssima, um sinal que não sou tão ruim, e com certeza, provavelmente
viverei mais uma penca de anos!
“Sinceramente, eu acho que sou a tal da “exceção da regra e tenho
direito de filosofar da vida!”
Escritor, Historiador, Cronista, Poeta e um dos Membros fundadores da
Academia Grapiúna de Letras!
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