Antonio Nunes de Souza*
Eu
nunca fui bonita. Desde menina que notava não ser escolhida para fazer os
papeis de princesa nas peças infantis. Sobrava pra mim o da bruxa, e a
professora sacana, dizia que era por eu ser boa atriz, pensando que estava me
enganando. Lógico que eu ficava puta da vida e não engolia essa farofa, mas,
tinha que segurar a barra, senão nem participaria das peças!
O
tempo passou, me formei em direito e depois de um ano saí da minha cidade Itabuna,
partindo para o Rio de Janeiro, já que tinha um amigo do meu pai que era um
advogado de renome, e prontificou-se a me dar uma vaga em seu conceituado
escritório, orientando-me no início da minha carreira. Modéstia à parte eu fui
uma aluna maravilhosa, chegando a ser a oradora da turma!
Já
no Rio, me instalei em um quarto e sala mobiliado, em Copacabana e, com dois
mês eu já estava entrosada com todos e, por sorte, havia um problema de herança
super volumoso financeiramente, que ninguém tinha encontrado uma maneira de
resolver, atendendo bem os interessado que sempre discordavam, e já passava de
um ano essa contenda!
Aí,
sigilosamente, peguei a tremenda papelada do processo, levei para casa, e
passei o fim de semana lendo e relendo a zorra toda e, como um relâmpago
divino, vislumbrou em minha mente a solução do assunto, de uma maneira que,
surpreendentemente, deixaria todos satisfeitos. Me lembrei até da genial “estória
dos camelos” de Malba Tahan o homem que calculava!
Claro
que fiquei louca que chegasse segunda feira, para demonstrar minha brilhante
ideia e, consequentemente, aumentar o meu conceito, além de ganhar alguma
grana, já que era uma questão de milhões, e cada pendência resolvida, aquele
que for o mentor, recebe 50% por cento do pagamento destinado ao escritório!
Cheguei
eufórica e cheia de alegria, falei logo ao Dr. José Antonio, que gostaria de
uma reunião com todos, pois, com muita atenção e perseverança, consegui algo
importante para o nosso escritório de advocacia. Ele estranhou um pouco, já que
eu sendo uma novata, o que poderia de especial eu teria para apresentar para
uma equipe experiente como a dele. Porém, gentilmente, chamou todos para a
grande mesa, nos sentamos, ele me deu a palavra, e eu, meia tremula, mas
confiante, comecei a falar que levei o processo para casa, estudei, li e reli,
e narrei detalhadamente a solução encontrada. Quando acabei de demonstrar meu
veredito, olhei e vi que estavam todos com as bocas abertas, olharam para mim
e, inesperadamente, bateram palmas e se levantaram vindo em minha direção com
abraços e beijos de parabéns!
Todos
se acercaram do processo, lendo e relendo as minhas instruções a respeito da
solução e, sem ter o que retocar, José Antonio ligou para as partes
interessadas, solicitando uma reunião no dia seguinte, pois, já havia chegado a
um denominador comum, que seria uma solução benéfica para ambas as partes!
Dia
seguinte a reunião foi realizada, os herdeiros felizes e sorrindo, tudo foi
assinado, eles me agradeceram e abraçaram. Mas, depois que eles se retiraram,
Dr. José Antonio me chamou em sua sala, e falou que o combinado no início do
caso foi de 20% de cota de pagamento para o escritório, e como a herança estava
avaliada em 110 milhões de reais, o valor seria de 22 milhões de reais, e como
ela foi quem resolveu essa pendência de mais de um ano, receberia por justiça a
quantia maravilhosa de 11 milhões, conforme o acerto normal entre todos!
Eu
quase morro de susto, quis recusar, mas, ele disse que era assim mesmo, que eu
mostrei muita habilidade, competência e, logicamente, teria que ser
recompensada. E que a vida de advogado é assim mesmo: tem épocas boas e
maravilhosas e outras que não pinga nem um centavo!
Recebi
o dinheiro, comprei um apartamento, mobilhei com bom gosto, um carro e sou hoje
procurada e consultada por uma clientela de ponta, tenho um faturamento
expressivo e muitíssimo acima da média, que me faz esquecer que não sou uma
mulher bonita, mas, altamente qualificada, competente e realizada
profissionalmente!
Como
tenho ainda 35 anos, um dia vai aparecer um homem que me valorize pelo que sou e
não pelo que aparento fisicamente!
Se
você não se acha bonita, jamais se desespere por essa razão. Seja qualificada e
competente que vencerá profissionalmente, pois, a aparência pouco influi. Posso
exemplificar que vatapá é feio e parece cocô de criança, e quando a gente come
é uma delícia!
Eu,
sinceramente, já transei com muitas “mulheres vatapá”. Aparências feias, mas,
muito gostosas!
*Escritor
– Historiador, cronista e poeta!
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