Antonio
Nunes de Souza*
Cinco
anos atrás, terminado meu curso de jornalismo, como todo jovem nos seus 25
anos, saí a procura de um estágio em um jornal ou revista de grande circulação,
com a intenção de começar atrelado aos bons e qualificados órgãos de imprensa e
comunicação! Juro que ralei bastante, mercado escasso, raras oportunidades e,
normalmente, as vagas eram ocupadas por parentes, filhos de amigos, indicados
de clientes publicitários, etc., mas, como Deus sempre dá uma ajuda a quem
batalha, depois de deixar uma porrada de currículos até nos pequenos, um dia
recebi um e-mail me convidando para apresentar-me na Folha de São Paulo, munido
dos meus documentos, no dia X as tantas horas!
Juro
que cheguei a tremer de emoção, pois, tratava-se de um dos melhores do país e,
certamente, estaria eu começando por onde muitos nem terminam suas carreiras.
Preparei cuidadosamente minha papelada, fiz unhas, barba, cortei cabelo, me
arrumando para dar uma boa impressão e conseguir ser admitido imediatamente. E
sabem que aconteceu exatamente isso! Sou simpático, educado, bem falante e,
modesta parte, inteligente e bastante eclético. Com essas características, não
foi difícil conquistar a aquiescência do meu entrevistador do RH, me dando ele um
ok, para que, no próximo dia, me apresentasse para trabalhar!
Fui
escalado para o departamento esportivo, achei ótimo pois sempre adorei futebol
e conheço profundamente, não só o fracassado nacional com o deslumbrante
internacional. Isso me deu um status na área que, mesmo sendo um simples
estagiário, todos me admiravam pelos meus grandes conhecimentos. Aí foi que
aconteceu eu ganhar minha “mega sena”, pois, estava previsto a ida do chefe do
departamento para Europa, com a finalidade de entrevistar uma das maiores
“estrelas”, jogador astro de um time super respeitado e cheio de premiações.
Mas, infelizmente, para meu chefe, ele teve uma crise de rins e foi operado de
urgência e, como era uma oportunidade conseguida com muito trabalho e
interferência de patrocinadores, na sua impossibilidade, ele me chamou no
hospital, conversou bastante, deu conselhos e falou que me mandaria em seu
lugar!
Não
sou lá esse católico todo, mas, nesse dia rezei bastante, agradeci a Deus e saí
às pressas para providenciar passaporte, substituição de passagens, nome nas
reservas de hotel, contato com a assessoria do jogador, etc., e tudo foi feito
com a ajuda dos departamentos responsáveis do jornal e eu, quatro dias depois,
estava voando para Barcelona. Lá chegando fui para o hotel, pois, na manhã
seguinte as nove horas teria o encontro com o craque e começaria o meu
trabalho!
Pela
manhã, depois de um café regado a muitas frutas, peguei um taxi e segui para a
sede do clube, onde lá chegando, já me esperavam em uma sala especial. Dei um abraço
no jogador, que era brasileiro, rimos e nos cumprimentamos com simpatia e
afetividade de conterrâneos, nos acomodamos, peguei meu gravador, testei, e
começamos a conversar!
Aconteceram
as conversas de praxe, uma ou outra fora do padrão sempre utilizado e, para
minha surpresa, ele me disse: Nunca falei sobre isso na vida, mas hoje me deu
vontade de confessar e dar um depoimento testemunhal da minha vida! Tenho
certeza que será uma bomba para toda imprensa do Brasil e do mundo! Cheguei a
tremer na base, pois, uma notícia sensacional e de primeira mão, faria de mim
um grande jornalista e marcaria para sempre a minha pessoa!
Quando
eu era menino, nos meus seis para sete anos, meu maior desejo era ser
professor. Porém, meus pais, principalmente a minha mãe, quando eu falava isso
ela me dava uma série de cascudos e dizia: Se respeite seu moleque, vá jogar
bola no campinho da favela e deixe essa merda de escola de lado! Querer ser
professor pra ganhar uma merreca e ficar passando necessidade e fazendo greves
pelas ruas? “Face besta seu idiota”. E pare de falar besteira, viu?
Fui
crescendo e como meu desejo era mesmo ser professor, sempre ia ao colégio. Mas,
quando chegava em casa, meus pais me metiam a “porrada” sem dó nem piedade e
diziam: Pegue seu tênis velho e vá para as peladas, nada de escola seu corno
trouxa. Não pari menino para ficar servindo de otário numa sala de aula. E eu,
como dependia deles e eram meus pais, terminei deixando a escola e me dedicando
exclusivamente a jogar bola pela manhã, tarde e as vezes até a noite batendo um
futebol de salão. Com isso fiquei craque e um dia um olheiro apareceu e me
levou para um time grande, que logo me capacitou fisicamente para ser um grande
goleador. Daí, para ir para a Europa foi um pulo, hoje estou, com 24 anos e
ganho em Euros e dólares uma fortuna, que jamais ganharia numa sala de aula. O
que ele ganha por mês eu, modesta parte, ganho por hora!
Agradeço
aos meus pais terem tirado da minha cabeça a ideia louca de ser professor, já
falo algumas línguas pelos contatos e viagens que faço e, em nenhum momento
sinto falta de não ter estudado! Todos me paparicam diariamente!
-E
seus pais onde estão?
-Moram
em uma mansão de cinco quartos, piscina, jardim, etc., com seus carrões com
motoristas a disposição! Construí um campinho de futebol em minha casa e meu
filho passa o dia todo treinando chutar com os dois pés com a mesma
intensidade. Toda vez que chego da rua, cobro dele umas batidas de pênaltis.
Quando ele erra, eu digo: Vou chamar vovó para lhe dar uns cascudos. E ele diz
logo: Não painho, vou caprichar!
Juro
que fiquei estarrecido e, mais uma vez, vi que o vil metal é que manda nesse
mundo. A educação está em baixa e ridicularizada, não sabendo o povo que isso é
o retrato decadente de uma civilização. Lastimo e sofro vendo isso!
Voltei,
meu trabalho foi bastante elogiado, por essa razão recebi várias propostas,
mas, preferi ficar, já na condição de jornalista oficial!
Não
sito o nome do craque porque não tenho autorização para tanto, pois, a
divulgação foi uma maravilhosa e sensacional exclusividade!
*Escritor
– Membro da Academia Grapiúna de Letras – AGRAL – antoniodaagral26@hotmail.com
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