Antonio Nunes de Souza*
Dois de julho, feriadão dos bons, nada mais justo que darmos uma esticada na Lapinha para ver o desfile da Cabocla. Na verdade a Cabocla seria apenas uma desculpa, pois, para ser sincero, meu interesse maior era admirar de perto toda “mestiçagem” baiana, que vai do preto ao sarará, mesclando com mulatas e mamelucas, mas, todas elas com bundinhas empinadas e bem torneadas, graças à origem africana que tem esse angelical dom de quadris sensuais e apetitosos.
Coloquei minha melhor bermuda, camiseta regata da moda, tênis com grife, óculos Ray-Ban, peguei o carro e, todo barbeado e perfumado, segui meu destino na esperança de me dar bem.
Fui pelo Barbalho imaginando encontrar caminhos mais livres, já que havido ouvido na TV que algumas ruas seriam interditadas. Mas, mesmo por essa trajetória, o trânsito estava uma merda. Parece que todos pensaram o mesmo que eu e as ruas estavam congestionadas, tendo que parar bem distante do largo e fazer o percurso a pé. Porém, isso não me deixou chateado, pois, andando, daria oportunidade de admirar melhor as pessoas que passavam, principalmente aquelas que na minha maliciosa mente eu desejava ver.
Na proporção que ia me aproximando a aglomeração aumentava o número de pessoas, já se acotovelando procurando lugares privilegiados, crianças, velhos, adultos, estudantes, funcionários públicos, além de grupos de professores grevistas que aproveitavam a festividade para fazer protesto contra os políticos ausentes e presentes, mostrando seus descontentamentos pelas não aceitações de suas reivindicações, algumas pertinentes e outras nem tanto. Mas, tudo isso faz parte da democracia e da badernagem que é peculiar nesses eventos públicos.
Notei de longe que o cortejo estava começando, então parei em um ponto estratégico e fiquei a espera da sua passagem, pensando em acompanhá-lo até o Campo Grande, onde, certamente, haveria vendedores de cerveja, churrasquinhos e outras iguarias, logicamente acompanhados de música e, com certeza, seria o momento que eu suavemente encostaria em algumas gatinhas no intuito de encontrar uma ao meu gosto para “ficar”.
E não deu outra! Assim que acabaram os discursos e todos começaram a se dispersarem, havia uma barraca que o samba de roda estava correndo solto e, no seu interior, estava reunida a fina flor do mulherio que, como eu, estava ali com as mesmas intenções. Entrei, comprei logo uma latinha de cerveja bem gelada e, ainda meio tímido, comecei a sacudir o corpo no ritmo bem cautelosamente.
Mas, com dez minutos, já estava sambando que nem uma carrapêta, pegando as meninas pelas cinturas, procurando escolher quem seria minha encantadora vítima.
“Quem samba fica, quem não samba vai embora. Quem é homem é meu senhor, quem é mulher minha senhora”. Esse refrão do mais famoso samba de roda de Santo Amaro ecoava ao som dos tambores e pandeiros, provocando um remelexo sensual e lascivo nas negras, mulatas e morenas que compunham a roda, estimulando desejos impiedosos nos mais polidos cristãos. Eu, por minha vez, sentia-me excitado não só de olhar, como também com as “roçagens” eventuais que o apertado ambiente proporcionava.
Colei com uma gata deliciosa chamada Natacha e passamos a dançar bem agarradinhos, sem nem reparar que estávamos no meio de uma festa de largo. Aliás, como todos os baianos, ninguém está mais ligando com quem está em sua volta. O importante é quem está ao seu lado ou em seus braços. Assim sendo, segui essa regra benevolente e continuei minha esfregação, sempre tomando mais uma cerveja para dar mais animação, diminuir a inibição e, consequentemente, aumentar o tesão.
Dezenove horas, já bastante cansado e cheio de expectativas, convidei Naty para irmos embora buscar o carro que deixei pelas bandas do ICEIA, e de lá seguiríamos para meu apartamento selar com chave de ouro nossa louvação a Cabocla e ao nosso digníssimo dois de julho. Ela, sem pestanejar, avisou as amigas que estávamos indo, trocamos beijinhos de despedidas, pois já estávamos todos muito íntimos, pegamos um táxi e seguimos nosso destino.
O restante não preciso contar, pois foi uma noite maravilhosa cheia de transas pecaminosas em diversas posições cívicas e patrióticas, homenageando a nossa data magna baiana. Natacha deu uma lição de cidadania, enlaçada no mastro como se fosse a bandeira da independência tremulando ao vento!
Viva Dois de Julho! Bahia de todos os Santos, Bahia de todos os pecados.
*Escritor (Blog Vida Louca – ansouza_ba@hotmail.com)
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