sexta-feira, 17 de abril de 2020

O PROJETO MAL ARQUITETADO!

                         Antonio Nunes de Souza*

Confesso que por mais experiente que possamos pensar que somos, estamos sempre abertos e passivos de nos deixar entusiasmar com nossos projetos de vida, comprovando cada vez mais que somos uns eternos aprendizes. E, como todo mundo, também caí nessa rede emaranhada como as teias de aranhas, me embaraçando com a régua e o compasso, tornando-me cega e perdendo as diretrizes das linhas.

Pelas minhas palavras iniciais, percebe-se logo que sou uma profissional na área de engenharia e, embora tenha alcançado um relativo sucesso no trabalho que desempenho, vacilei na prancheta da vida e passei a sonhar com o abstrato, imaginando ser ainda uma adolescente, não sabendo enfrentar com dignidade e frieza os acidentes de percursos tão comuns quando atingimos determinada idade. Não que me ache velha caquética. Ao contrário! Sou conservada, tenho 45 anos, mentalidade jovem e uma cabeça super pra frente e, exatamente por essa razão, resolvi ir morar numa cidade especial, onde a liberdade de ação e comportamento faz parte integrante da região, podendo-se encontrar de hippes dos anos 60 até vanguardistas do próximo século, intercalados por caretas da pré-história. Uma mistura heterogênea que faz da cidade um lugar especial: Lençóis!

E sendo dessa forma, logicamente, entrei no clima de cabeça e me transformei em uma micro “riponga”, porém, muito respeitada pela minha habilidade profissional.
Mas, como viver sozinha quando ainda sinto o gostinho e a necessidade de companhia, carinho e sexo? Lógico que teria que procurar uma solução que não fossem as “ficadas” eventuais.
Aí foi que pintou o perigo! Pois, em função do meu status, claro que desejei o melhor: Um rapaz jovem, boa aparência, condições financeiras deixando a desejar e, acima de tudo, não muito inteligente para que eu pudesse dominá-lo através de carinhos e, principalmente, presentes para que sua dependência cada vez aumentasse mais, juntamente com o meu domínio de proprietária do meu querido guapo, como se fosse mais um troféu para exibição e uso, que um amor conquistado pelos meus atributos.
Tudo isso seria bom se eu antes já pensasse assim, mas, na minha cegueira e tolice, procurei, grosseiramente, criar em minha mente a idéia utópica que essa situação era normalíssima, que estava havendo um elo de amor e paixão e, sempre que relatava o fato para amigos, para dar ênfase, eu juntava os indicadores e polegares de ambas às mãos esfregando as quatro unhas, querendo, tolamente, mostrar que estava havendo uma junção miraculosa de um amor que brotou na chapada, abençoado pelos anjos e a fumaça da bendita “sativa”.
Mesmo vendo claramente o esboço de um projeto que parecia bonito, mas, desprovido de alicerce, sonhava falando com entusiasmo, querendo enganar a mim própria.
Pô! Quando me lembro disso tenho uma vergonha retada dos meus discursos tolos que fazia e sentia nos olhos de todos a descrença estampada. Mas, para mim, era conveniente tentar convencer que todos estavam errados e eu, mesmo sabendo que não, continuava enfática. Essa lembrança me dá uma raiva da porra!
O tempo foi passando, passando, precisando cada dia, necessário maiores presentes para compensar os menores carinhos, até que percebi que aquele elo manual que tanto eu repetia, não passava de uma maneira gestual que criei para ilustrar minha ilusão.
Imagine vocês que o cara que eu enfeitava todo, perfumava, alimentava e dava os melhores dos meus carinhos, passou a ter aventuras com outras pessoas, evitando minha companhia alegando uma série de desculpas esfarrapadas que, inicialmente, mesmo percebendo claramente, fazia força para não acreditar e não me dar como vencida por uma realidade mais que esperada.
Lógico que esse meu comportamento nada teve de anormal! Apenas o que eu deveria era encarar a situação com mais realismo, conscientizando-me que eu estava era, simplesmente, comprando um instrumento de prazer que, provavelmente, tinha prazo de validade. Talvez ou com certeza, não teria me exposto a uma situação melindrosa e um tanto ridícula perante todos e também a mim.

Contudo, mesmo com mais essa experiência frustrante, tive dias maravilhosos de ilusões prazerosas e, melhor que tudo, ensinou-me que devo ser mais realista nos meus projetos pessoais, assim como sou nos profissionais.

Depois que implodiu esse castelo de sonhos que construí em minha mente, sinto-me bem mais preparada para não ter que usar antolhos quando aparecer outro sol brilhando em meu horizonte.

*Escritor–Membro da Academia Grapiúna de Letras-AGRAL- antoniomanteiga.blogspot.com-antoniodaagral26@hotmail.com


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