quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

Experimente para ver se é vida fácil!

Antonio Nunes de Souza*

Aprendi desde menina que mulheres prostitutas eram as “mulheres de vida fácil”. E assim, como era hábito ouvir as opiniões dos mais velhos e experientes, principalmente avós e pais, fiquei com esse conceito gravado em minha cabeça, achando que elas no fundo eram privilegiadas, pois, em casa sempre ouvia meus familiares dizerem: Nossa, como essa vida é difícil!
O tempo foi passando, morando naquela modesta e pequena cidade, terminei o segundo grau e, como não havia faculdades, meditei um ano e depois resolvi ir para uma cidade grande enfrentar um trabalho e continuar meus estudos, pois sempre sonhei em me formar numa escola superior. Com dezenove anos, jovem e bonita, uma qualificação não tão boa, pois o colégio público não era lá essas coisas, me despedi da família entre choros e abraços, tomei meu ônibus levando minha mala com as melhores roupinhas e um dinheiro que toda família arrecadou para que fosse necessário em pagar um pensionato por quatro meses, tempo que achei que encontraria um emprego, mesmo modesto.
Não precisa dizer que, ao desembarcar na rodoviária do Rio de Janeiro, fiquei ultra assombrada com a loucura de gente, as correrias parecendo um formigueiro gigante. Conforme combinado, uma prima distante estava me esperando para levar-me até um pensionato modesto que eles haviam acertado. Mesmo sem conhecê-la nos localizamos através de um cartaz que ela exibia no alto com o meu nome. Peguei a mala e tomamos um ônibus lotado indo para nosso destino. Ela foi embora, me acomodei no meu quarto, tomei um banho no banheiro coletivo do corredor e, deitada comecei a meditar o que seria de mim numa cidade tão grande e estranha. Terminei dormindo e descansei da longa viagem.
Passados três meses, o dinheiro acabando, distribuí centenas de currículos e nada de surgir algo que valesse a pena ou, pelo menos, desse para as despesas básicas. Nessas caminhadas conheci Marlene que, embora estivesse procurando trabalho fixo, sempre estava arrumadíssima, perfumada e com grana para até almoçar fora.
Curiosa perguntei a ela como conseguia tais façanhas. E ela, sem a menor cerimônia me disse: minha filha eu me viro com alguns homens durante o mês e consigo grana para todas as minhas despesas e ainda sobra para curtir um pouco e pagar a faculdade. Chocada, perguntei: você é mulher de vida fácil?  Fácil uma porra, foi o que ela respondeu na bucha! Tenho que enfrentar todos os tipos de homens, uns querem boquetes, outros a xoxota, a maioria a bunda, que cobro mais caro, e uns velhotes com suas rolas murcham tenho que ficar com os braços doendo para bater punhetas e eles demoram uma vida para gozarem. Não acho nada fácil isso, mas, nunca chego em meu pequeno AP com menos de cem reais todos os dias. De segunda a sábado, pois no domingo descanso e arrumo a casa. Você é bonita e se quiser eu lhe dou uma força indicando-a para alguns fregueses. Em princípio achei até um insulto a proposta, mas, minutos depois, já puta da vida pelo que estava acontecendo e não querendo voltar para o interior, comecei a perguntar detalhes para ver se me adaptaria a tal situação. Sinceramente, da maneira alegre e tranqüila que ela falava, passei a achar até agradável e lucrativo esse trabalho, ainda mais que ela dizia sorrindo: minha filha essas merdas você lavou estão todas novas de novo. Pode até doer um pouco, principalmente na bunda, mas, muitas vezes você goza também e ainda leva sua grana tranqüila.
Acertamos para eu começar no dia seguinte e ela me arranjou um cliente dos bons, educado e generoso que, sabendo da minha condição de virgem e iniciante, me deu uma série de aulas, foi delicado ao me tirar o cabaço e, depois de tudo, me deu trezentos reais, que dava para pagar um mês de pensionato. Dei tantos beijos na despedida que ele até ficou desconfiado! Claro que fui correndo falar com minha amiga, com a maior alegria estampada no rosto, agradecer a dica e pedir para me arranjar outro cliente.
Hoje, passados quinze anos, estou formada em arquitetura, tenho meu apartamento próprio, duas salas amplas onde funciona meu escritório de projetos e decorações interiores, carro último ano e tenho a maior respeitabilidade em Campinas-SP para onde me mudei após a formatura, para esquecer e apagar as imagens do passado, começando uma nova vida. Mas, embora tenha me ajudado muito a realizar os meus sonhos, tive muitos pesadelos, pois, não foi fácil ter que nesse período engolir litros de espermas, receber dezenas de metros de rolas na frente e atrás e ainda me deparar muitas vezes com caras mal educados que me olhavam e tratavam com o maior desprezo.
Se alguém acha que isso é vida fácil vá experimentar! Eu fui uma das poucas que deu sorte, pois, a maioria, sofre com DSTs, principalmente a AIDS!

*Escritor – Membro da Academia Grapiúna de Letras de Itabuna – antoniodaagral26@hotmail.com


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