Antonio
Nunes de Souza*
Aprendi desde menina que
mulheres prostitutas eram as “mulheres de vida fácil”. E assim, como era hábito
ouvir as opiniões dos mais velhos e experientes, principalmente avós e pais,
fiquei com esse conceito gravado em minha cabeça, achando que elas no fundo
eram privilegiadas, pois, em casa sempre ouvia meus familiares dizerem: Nossa,
como essa vida é difícil!
O tempo foi passando, morando
naquela modesta e pequena cidade, terminei o segundo grau e, como não havia
faculdades, meditei um ano e depois resolvi ir para uma cidade grande enfrentar
um trabalho e continuar meus estudos, pois sempre sonhei em me formar numa
escola superior. Com dezenove anos, jovem e bonita, uma qualificação não tão
boa, pois o colégio público não era lá essas coisas, me despedi da família
entre choros e abraços, tomei meu ônibus levando minha mala com as melhores
roupinhas e um dinheiro que toda família arrecadou para que fosse necessário em
pagar um pensionato por quatro meses, tempo que achei que encontraria um
emprego, mesmo modesto.
Não precisa dizer que, ao
desembarcar na rodoviária do Rio de Janeiro, fiquei ultra assombrada com a
loucura de gente, as correrias parecendo um formigueiro gigante. Conforme
combinado, uma prima distante estava me esperando para levar-me até um pensionato
modesto que eles haviam acertado. Mesmo sem conhecê-la nos localizamos através
de um cartaz que ela exibia no alto com o meu nome. Peguei a mala e tomamos um
ônibus lotado indo para nosso destino. Ela foi embora, me acomodei no meu
quarto, tomei um banho no banheiro coletivo do corredor e, deitada comecei a
meditar o que seria de mim numa cidade tão grande e estranha. Terminei dormindo
e descansei da longa viagem.
Passados três meses, o
dinheiro acabando, distribuí centenas de currículos e nada de surgir algo que
valesse a pena ou, pelo menos, desse para as despesas básicas. Nessas
caminhadas conheci Marlene que, embora estivesse procurando trabalho fixo,
sempre estava arrumadíssima, perfumada e com grana para até almoçar fora.
Curiosa perguntei a ela como
conseguia tais façanhas. E ela, sem a menor cerimônia me disse: minha filha eu
me viro com alguns homens durante o mês e consigo grana para todas as minhas
despesas e ainda sobra para curtir um pouco e pagar a faculdade. Chocada,
perguntei: você é mulher de vida fácil?
Fácil uma porra, foi o que ela respondeu na bucha! Tenho que enfrentar
todos os tipos de homens, uns querem boquetes, outros a xoxota, a maioria a
bunda, que cobro mais caro, e uns velhotes com suas rolas murcham tenho que
ficar com os braços doendo para bater punhetas e eles demoram uma vida para
gozarem. Não acho nada fácil isso, mas, nunca chego em meu pequeno AP com menos
de cem reais todos os dias. De segunda a sábado, pois no domingo descanso e
arrumo a casa. Você é bonita e se quiser eu lhe dou uma força indicando-a para
alguns fregueses. Em princípio achei até um insulto a proposta, mas, minutos
depois, já puta da vida pelo que estava acontecendo e não querendo voltar para
o interior, comecei a perguntar detalhes para ver se me adaptaria a tal
situação. Sinceramente, da maneira alegre e tranqüila que ela falava, passei a
achar até agradável e lucrativo esse trabalho, ainda mais que ela dizia
sorrindo: minha filha essas merdas você lavou estão todas novas de novo. Pode
até doer um pouco, principalmente na bunda, mas, muitas vezes você goza também
e ainda leva sua grana tranqüila.
Acertamos para eu começar no
dia seguinte e ela me arranjou um cliente dos bons, educado e generoso que,
sabendo da minha condição de virgem e iniciante, me deu uma série de aulas, foi
delicado ao me tirar o cabaço e, depois de tudo, me deu trezentos reais, que
dava para pagar um mês de pensionato. Dei tantos beijos na despedida que ele
até ficou desconfiado! Claro que fui correndo falar com minha amiga, com a
maior alegria estampada no rosto, agradecer a dica e pedir para me arranjar
outro cliente.
Hoje, passados quinze anos,
estou formada em arquitetura, tenho meu apartamento próprio, duas salas amplas
onde funciona meu escritório de projetos e decorações interiores, carro último
ano e tenho a maior respeitabilidade em Campinas-SP para onde me mudei após a
formatura, para esquecer e apagar as imagens do passado, começando uma nova
vida. Mas, embora tenha me ajudado muito a realizar os meus sonhos, tive muitos
pesadelos, pois, não foi fácil ter que nesse período engolir litros de
espermas, receber dezenas de metros de rolas na frente e atrás e ainda me
deparar muitas vezes com caras mal educados que me olhavam e tratavam com o
maior desprezo.
Se alguém acha que isso é
vida fácil vá experimentar! Eu fui uma das poucas que deu sorte, pois, a
maioria, sofre com DSTs, principalmente a AIDS!
*Escritor – Membro da
Academia Grapiúna de Letras de Itabuna – antoniodaagral26@hotmail.com