Antonio Nunes de Souza*
Graças ao bom Deus e a confusa e contraditória tecnologia científica moderna, que um dia recomenda correr, outro para apenas andar, comer e não comer ovo, chocolate, sal, carnes vermelhas, usar e não usar adoçantes, nos proibir os refrigerantes e até o nosso cafezinho tradicional, que, aliás, agora está sendo até recomendado para algumas doenças (não sei se para melhorar ou piorar). Todas essas novidades científicas nos deixam confusos, sem contar os modismos da macrobiótica e os naturebas verdadeiras lagartas comedoras de folhas.
O fato é que, apesar do estresse do trabalho e das agitações das cidades, quem consegue não ser atropelado, morrer de batida de carro, receber uma bala perdida ou assaltado, pode chegar a cem anos sem que seja Canô Velloso, nem Oscar Niemayer.
E, desfrutando dessa dádiva, foi que um casal de amigos chegou aos 95 anos e, organizada a comemoração de 75 anos de casados pelos netos e bisnetos, reservaram a suíte presidencial do melhor motel da cidade para que os queridos velhinhos desfrutassem de uma noite inesquecível.
De início eles refutaram, mas, com jeito a turma conseguiu convence-los!
Chegado o dia, todos se dirigiram para a igreja para as comemorações religiosas, acompanhadas de foguetórios e repicar de sinos para dar brilho ao bonito e raro evento: Bodas de Diamantes!
Após essa parte inesquecível, bastante fotografada e filmada pelos familiares e fotógrafos contratados, parentes e aderentes seguiram acompanhando o casal até o carro especial que o levaria ao motel para a noite nupcial.
Na porta do motel foram recebidos por uma funcionária vestida a caráter, levando-os em direção a suíte. Ambos, embora felizes, estampavam nos rostos sorrisos amarelos em função da situação nunca vivida, mesmo nos tempos passados. Entraram, fecharam à porta e depararam com uma faixa: “Parabéns Guima e Cris”. Muitas flores enfeitavam o ambiente e, sobre a mesa de centro, um balde com gelo aconchegava uma garrafa de champanhe francesa da melhor qualidade.
Eles deram uma boa gargalhada e disseram em coro: Esses meninos são loucos inventando uma coisa dessas!
Como era normal, estavam cansados e loucos para tomar um banho, livrando-se das roupas sofisticadas e sociais que foram obrigados a vestir para a cerimônia religiosa. Ele sentou-se e ela começou a despir-se enquanto, atentamente, observava aquela inocente e conhecida strip-tease. O rosto retalhado pelas marcas do tempo, o pescoço carregava uma papada murcha e volumosa, os seios pareciam duas meias com moedas dentro, a barriga, mesmo ainda grande, tinha mais pneus que nos boxes de Formula Um. A última dobra servia, tranquilamente, de tapa sexo ou avantajado biquine, pois, mesmo um curioso, não conseguiria ver nada! As pernas e braços já não tinham massas musculares, apenas às securas das peles, enfeitadas por uma incalculável quantidade de veias. Ao virar-se para entrar no banheiro ele deu um mudo sorriso olhando aquela bunda que outrora lhe seduzia tanto, e estava mais caída que a bolsa de Nova York em 1929.
Terminado o banho ela saiu do banheiro já vestindo um confortável e novo pijama, e ele, levantando-se começou a desnudar-se, enquanto ela senta-se e passa a apreciá-lo. Seu rosto era um verdadeiro maracujá de tão enrugado que estava, a boca murcha equilibrando a dentadura que dançava geralmente quando ele falava, o pescoço parecia de um peru pela quantidade de pelancas, a barriga estava bem mais para uma bacia amassada que o mais modesto dos tanquinhos, o pinto parecia uma verruga incrustada num saco de confete, pernas pouco firmes além de finas, enfeitadas por uma série de varizes e um início de erisipela. Quando virou as costas, ela, curiosamente, também deu um sorriso ao ver que seu bumbum estava mais lisa que uma tábua de passar.
Terminado seu demorado banho, saiu vestindo um pijama de flanela com calças e mangas compridas, abriu a champanhe, serviu duas taças e, num drink, brindaram a data tão significativa para eles. Sem querer comer nada, pois já tinham lanchado antes do evento, deitaram e ela disse olhando nos seus olhos: Eu lhe amo muito meu querido!
E ele, com lágrimas nos olhos, respondeu: Você sempre foi e será a mulher da minha vida!
E, como era de se esperar, se abraçaram e dormiram o sono inocente da felicidade!
Esse casal é uma prova rara e bela de amor, pois, é por essa razão que Deus amplia cada vez mais as nossas vidas, na esperança de nos tornar mais humano!
Para que servirá viver mais sem amor, solidariedade e respeito aos semelhantes?
*Escritor (Vida Louca – ansouza_ba@hotmail.com – antoniomanteiga.blogspot.com)
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