domingo, 19 de junho de 2011

Uma noite de S. João!

                                                Antonio Nunes de Souza*

Tempos passados transportei-me para uma noite junina, enfrentando o frio úmido da beira rio, vislumbrando nosso lindo e poluído Cachoeira, ornamentado por uma nova praça de lazer, onde as bandeirolas dançavam ao som do vento e das bandas, caracterizando o nosso Carnajoão Baiano.
O povo, na euforia peculiar interiorana, deliciava-se com o feriadão junino, entregando-se as sensuais danças, esquecendo-se momentaneamente seus problemas. Essa, aliás, é uma característica acentuada do brasileiro. Historicamente, uma herança dos povos africanos que, em todas as ocasiões especiais (caça, pesca, guerra, paz, casamento, morte, etc.), usavam cantos e danças como ritual necessário e eficiente. E, graças a isso, somos um povo sofrido, mas, paradoxalmente, super alegre.
O camarote oficial estrategicamente armado em frente ao palco principal proporcionava uma visão perfeita dos shows apresentados, como também para vislumbrar a multidão enlouquecida requebrando numa esfregação deveras maliciosa e salutar. As roupas eram de uma diversificação deslumbrante. Podia-se ver de micro saia até exagerados trajes compatíveis com o frio andino. Não vi aquela antiga “Rita vestida de chita, com um laço de fita que não tem mais tamanho”. Não se fazem caipiras como antigamente, graças a intolerável globalização através da TV. Em compensação deparei-me com dois guapos gaúchos vestidos a caráter, dando um toque especial ao ambiente. Talvez essa versatilidade de ritmos, roupas, danças e iguarias sejam o que tornam especiais as festividades brasileiras, principalmente a baiana, já que miscigenação aqui é mais abundante e os novos hábitos e costumes aportam diariamente através do turismo.
Além das mesas ornamentadas com garrafas de licores diversos, os quitutes eram abundantes para que os convidados especiais se deleitassem durante os papos políticos, sociais e econômicos, entremeados de abobrinhas eventualmente ocorridas nessas ocasiões. Mas, repentinamente, conheci alguém com interesses compatíveis com os meus e, imediatamente, começamos a conversar sobre os nossos sonhos de pretensos escritores literários. Senti no seu olhar uma vontade forte de explodir um romance dantesco sobre a vida de uma mulher que, embora comum, apresentava nuances especiais dignas de serem narradas. Dentro da complexidade eclética dessa figura feminina, havia um homem que, como eu, chamava-se Antonio. Ri com a conhecidencia e interessei-me mais ainda por saber maiores detalhes. Claro que não foi possível em função das interrupções constantes, como também pelo processo criativo ainda estar em andamento. As idéias estão coordenadas, entretanto a estruturação ainda requeria um andamento com ponderação e estudos criteriosos. Graças a Deus os meus escritos são livres de compromissos e não me preocupo por minúcias ou detalhes. Simplesmente escrevo para descrever momentos, sem a preocupação de compromissos com a posteridade ou transmitir conhecimentos profundos, inclusive porque não tenho para dar. Isso se torna mais fácil passar para o papel as descartáveis criações que pintam em minha branca cabeça. Entretanto, sei admirar profundamente os escritores coerentes e filósofos do presente e do passado.
Gostei desse novo conhecimento, pois, em nossa cidade, dificilmente encontra-se pessoas interessantes intelectualmente. Antes se conversava das pompas e riquezas. Hoje, crise e violência. Esses papos são tão pobres como as imaginações dos interlocutores. Minha idade já não dispõe de paciência para tal sacrifício.
Espero que tenhamos oportunidade de nos encontrar novamente e, que desta feita, possamos simbiosamente, trocar mais figurinhas.
Foi bom que essa fogueira de S. João tenha acendido uma nova amizade!

*Escritor (Vida louca – ansouza_ba@hotmail.com – antoniomanteiga.blogspot.com)                                                      

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