*Antonio Nunes de Souza
Os homens, segundo a história bíblica e também a universal, quando foram feitos pelo oleiro Mor ou chegaram de algum lugar do universo, encontraram a terra cheia de morros, montanhas, desertos, mares, rios, lagos, florestas, animais silvestres e ferozes, etc. Assim sendo, foram proliferando desordenadamente, vivendo em grupos, procurando melhores lugares para formar suas comunidades e fincar suas raízes, transformando tudo de agreste que existia em locais agradáveis, aprazíveis, salutares e, principalmente, que oferecessem as melhores comodidades possíveis, almejando alcançar a qualificação ideal, ou seja, a designação de civilizados.
Milhares de anos se passaram, criaram linguagens para suas comunicações, determinaram regras, leis e padrões, transformando aquele mundo selvagem em vilas, cidades e metrópoles. Colocaram monumentos simbólicos demonstrando suas conquistas e suas vitórias, cada lugar querendo ser o que construía maior e mais bonito ícone representativo.
Inventaram os mais sofisticados aparelhos de comunicação, partindo dos sinais de tambores e fumaça, chegando ao rádio, telefone fixo, celular, televisão, internet, chips via satélites, radares e outras coisas mais, que já passaram hoje a serem de somenos importância ou obsoletos.
Para suas locomoções, que eram verdadeiras maratonas de andanças e arriscadas viagens através de cipós, conseguiram substituir esses sufocos inventando a roda, depois a carroça, bicicleta, moto, carro, avião, helicóptero, nave espacial e uma série de outras máquinas para tais fins.
Para deleitar seu paladar e desejos gustativos, nada mais justo que, usando a imaginação, criar e produzir boas bebidas e iguarias ultra-sofisticadas, utilizando condimentos super exóticos e raros, que não lembram nem de perto aqueles javalis crus que eram devorados, sem nenhuma educação pelos trogloditas seus antepassados.
Aí, depois dessa maravilhosa transformação, ao custo de milhões e milhões de anos, mortes, sacrifícios e muito trabalho, o homem, mais que justamente, orgulhou-se por ter alcançado, praticamente, todos seus objetivos e uma vida digna perante a humanidade.
Então, depois de estar desfrutando de todas essas maravilhas, ele começou a perceber quanto ele está cercado de problemas em função de tudo que foi criado ao longo dessa caminhada, causando-lhe uma novidade até bem pouco tempo desconhecida, logicamente, pela sua inexistência: O stress. Este é nada mais nada menos que a sensação de desconforto de ter que viver cercado de loucuras e tarefas do cotidiano. Causa uma impaciência ilimitada, irritação e, automaticamente, um processo depressivo igual à de quem comprou o ingresso para ver uma apresentação de Milton Nascimento e, errando de teatro, se bate com um show de Waldick Soriano.
Resultado: O homem passou a rever seus criados conceitos de vida maravilhosa, cidades deslumbrantes, segurança, comidas saborosas, transportes rápidos e, principalmente, meio ambiente. E, num processo de lentidão similar ao de uma preguiça paraplégica, chegou à conclusão óbvia que tudo isso é uma utópica ilusão. Pois, os milhões de carros transitando nas ruas e estradas causam desastres físicos e ecológicos, congestionamentos nas horas mais importantes, as comidas condimentadas e gordurosas são venenos para corpo, os telefones (principalmente os celulares) sempre estão falhando ou nos localizando nos lugares indevidos, as televisões, rádios e jornais mentem e são tendenciosos. Enfim, que é uma verdadeira droga a vida na cidade!
Principalmente nas grandes metrópoles, onde além dos tormentos existentes, você ainda está passivo de ser assaltado, seqüestrado, morto por uma bala perdida ou por algum policial querendo mostrar serviço (provavelmente para algum traficante).
Que fazer então?
Claro que voltar às origens! E, pensando nisso, um amigo meu já comprou um pedacinho de terra na Chapada Diamantina, mais precisamente em Igatú, e está agilizando a construção de uma casinha estilizada no alto de uma montanha, onde ele pode vislumbrar a mata selvagem, o céu azul durante o dia e o luar estrelado a noite. Passear durante o dia nas insólitas picadas com direção as rústicas quedas d’água, encontrar dormindo no caminho algumas cobrinhas inofensivas ou não, ouvir os pássaros cantando com naturalidade e desenvoltura, ao tempo que vai respirando um ar mais puro e limpo do que bolso de professor e matando os mosquitinhos nativos que atacam, ávidos para saborearem o sangue novo na praça.
Só em chegar ao destino, poder parar o carro e não aparecer, misteriosamente, um flanelinha dizendo: “Pode deixar que eu tomo conta, doutor!” Vale fugir de qualquer cidade. Sem contar os moto-taxis que nos matam de sustos e perigos!
Acho que o homem está certíssimo em tomar essa correta atitude. Estou até pensando em aderir esse comportamento, mas, se eu não tiver ao meu lado uma maravilhosa mulher para me tentar e atentar, não serei capaz de mudar radicalmente meu habitat. Isso com direito a trocas eventuais para quebrar a rotina. Pois, depois de determinado tempo convivendo a calmaria local, a variação de diálogos terminará sempre com os mesmos temas e, infelizmente, essa permuta torna-se essencial. Claro que na cidade grande nosso grau de tolerância é muito mais ampliado, pois não temos nem tempo de conversar em função do labor durante o dia e a tv durante a noite.
Não quero que pensem que sou um maníaco sexual de maneira nenhuma, mas, viver num paraíso sem uma Eva semestral, prefiro morrer estressado nas loucuras das cidades!
Vou providenciar a compra de meu pedacinho do céu em Igatú, procurar minha parceira temporária, arrumar os meus paninhos e: Adeus civilização ingrata!